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As relações entre Política e Guerra: alguns aspectos positivos e negativos e o caso do Brasil

A última moda linguística, tanto na Internet quanto fora dela, é chamar as pessoas de “guerreiras”. É “guerreiro” para lá e “guerreira” para cá. O termo tem uma conotação aparentemente positiva, significando a pessoa empenhada em lutar pelos seus direitos ou por melhorias na sociedade em geral. O uso da palavra traz ínsita a noção de que a arena política tem muito de uma arena de guerra. A política é a guerra por outros meios, ditos civilizados. Os mesmos conflitos de interesses que levam a uma guerra continuam presentes na política. Isso é uma constatação objetiva que, como em tudo na vida, tem os seus aspectos positivos e negativos.

É positiva a substituição da guerra pela política porque se abre mão das armas e das mortes em massa na hora de resolver conflitos de interesses. Foi mais ou menos o mesmo sentimento que levou à criação do Poder Judiciário para ser o terceiro imparcial que iria resolver os conflitos entre os cidadãos com base na lei, impedindo que as pessoas aderissem à violência para resolver os seus litígios. Toda a história da construção dos Estados e das relações sociais é marcada pelo objetivo de abandonar a violência como meio válido de resolução dos conflitos.

O aspecto negativo é que, por mais que exista um esforço para impedir o clima de guerra entre as partes envolvidas numa determinada disputa, ele nunca é totalmente dissolvido ou afastado. O clima beligerante sempre se fará presente e influenciará comportamentos, atitudes e ações. A questão é que, apesar de ser normal essa animosidade beligerante, pelo menos até certo ponto, o fato é que não se pode violar certas regras éticas e legais, que são o que garantem que a disputa não assuma ares destrutivos, como acontece numa verdadeira guerra, onde o inimigo deve ser eliminado.

O que acontece atualmente no cenário político brasileiro evidencia esse aspecto negativo muito bem. O golpe de estado dado por Michel Temer et caterva e as reformas antipopulares do seu governo golpista são praticamente “atos de guerra”, se considerarmos a reação violenta que lhes é intrínseca a toda uma política mais democrática e voltada ao combate à desigualdade social.

Também é possível detectar esse clima de guerra inerente à Política no uso distorcido do Poder Judiciário como arma estratégica e muito eficiente de ataque aos adversários políticos, como o tipo de ação judicial perpetrada pela Lavajato, onde Lula é a principal vítima.

O termo em inglês para esse tipo de atuação ilegítima do Poder Judiciário é “lawfare”, que basicamente significa o uso distorcido do Direito, entendido como o ordenamento jurídico, e do aparato judicial como verdadeiros instrumentos ou armas que devem ser usados para atacar adversários ou inimigos políticos. Esse uso distorcido do Direito e do aparato judicial sempre estará a serviço de determinados interesses políticos e econômicos.

O lawfare atualmente, no cenário internacional e dentro das disputas que existem, assume características de uma estratégia oficial de guerra, encampada por muitos países, principalmente os EUA, que são pioneiros em usar o aparato jurídico-normativo e judicial para atacar quem venha a ser considerado adversário ou inimigo político.

O lawfare é hoje uma das maiores ameaças ao Estado Democrático de Direito porque ele implica uma nefasta distorção dos objetivos e da própria natureza do Direito e do Poder Judiciário. Noções como imparcialidade do juízo, aplicação correta da lei, investigações sérias, que não forjam provas, tudo isso fica gravemente comprometido.

O pior nesse tipo de situação é que o ataque político ilegítimo, perpetrado por meio dos sistemas oficiais de justiça, praticamente funciona como uma blindagem a todo tipo de injustiça, passando-se por algo aceitável simplesmente porque a ação parte dos órgãos oficiais do Estado, com tudo sendo feito aparentemente dentro do que está previsto em lei.

O golpe de estado no Brasil, que é considerado muito sofisticado por analistas políticos internacionais, está impregnado dessas características. Eles usaram uma possibilidade prevista na lei para forjar uma acusação de crime de responsabilidade e, dessa forma, tomarem o poder por meio de um golpe parlamentar.

É a tentativa de constitucionalizar um golpe de estado, estratégia que, como se viu, é muito eficiente quando se tem poder para implementá-la. No caso do Brasil, foi mais fácil de executar esse tipo de golpe porque, paradoxalmente, a Constituição brasileira tende a abrir espaço para esse tipo de ação ilegítima do parlamento. De certa forma, a Constituição brasileira abriga esse tipo de iniciativa golpista. É como se o golpe fosse uma possibilidade real admitida pela Constituição.

Isso fica claro quando a atuação do Parlamento no processo de impeachment é soberana e não se submete a nenhum tipo de controle popular. O povo é completamente alijado do processo de impeachment. O Poder Judiciário somente exerce um controle superficial das ações do Parlamento, podendo verificar, no máximo, se os ritos e procedimentos foram cumpridos. O Judiciário não está, por exemplo, autorizado a entrar no mérito de uma decisão do Parlamento tomada no processo de impeachment. Por mais que a a decisão do Parlamento esteja desprovida de provas e sem amparo em lei, não há nada que se possa fazer.

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Cenas da ditadura, do estado de exceção instaurado no Brasil

O Brasil já vive uma ditadura e/ou um estado de exceção há muito tempo. E a culpa é de quem defendeu o golpe de estado, dos que votam em Bolsonaro e dos que ficam repetindo “Jesus no controle” ou “Deus no controle”.

Basicamente foi essa a tríade que literalmente acabou com o Estado Democrático de Direito no país e o transformou numa ditadura atrasada, obscura, reacionária, autoritária, onde os abusos se multiplicam no dia a dia. Tudo está dentro do que eu dizia que ia acontecer caso o golpe de estado contra Dilma Rousseff passasse.

Nos últimos dois, três anos, eu já escrevia sobre essa tendência que era muito perceptível no Brasil. Eu sabia que ia acontecer esse movimento reacionário e de perseguição. Depois de todo golpe vem uma ditadura, eu dizia.

Os fatos que atualmente ocupam o noticiário apenas me dão razão. É conservadorismo reacionário contra a liberdade de expressão nas artes, movimento que eu penso que foi inclusive orquestrado, ou seja, combinado para criar a polêmica.

Tenho motivos para acreditar, em tempos de pós-verdade, onde se age ativamente para fabricar motivos e distorcer a realidade, inclusive valendo-se de encenações, e dado o inusitado da situação, que aquela mãe que estava com a filha pequena na apresentação de um artista performático no MAM (Museu de Arte Moderna) em São Paulo participou da orquestração, combinado com o MBL. Suspeito seriamente disso. Seria uma false flag operation (operação sob falsa bandeira), algo encenado para parecer espontâneo, quando tudo foi previamente planejado com a intenção de gerar a reação moralista conservadora que se seguiu.

É juiz de direito perseguido por se manifestar contra o golpe de estado, o que jamais pode ser considerado atividade político-partidária, mas sim mera manifestação de um cidadão que por acaso é juiz.

É cidadão sendo preso e espancado na rua enquanto estava trabalhando.

É a criminalização dos movimentos sociais.

É a criminalização do Partido dos Trabalhadores e de quem é filiado ao PT, bem como de seus simpatizantes e eleitores.

É a implementação de reformas legislativas que retiram direitos que são verdadeiras conquistas para os trabalhadores, a exemplo da reforma trabalhista e previdenciária, jogando o país numa situação de puro retrocesso, chegando ao cúmulo de hoje existir proposta expressa que pretende literalmente acabar, extinguir com a Justiça do Trabalho, conforme apresentado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.

É a edição de leis absurdas, que expressamente proíbem palavrãos e nus nas obras de arte (uma lei editada nos últimos dias pela Assembleia Legislativa do Espírito Santo defende expressamente isso, ver aqui: https://g1.globo.com/…/assembleia-aprova-projeto-que-proibe…) e por aí vai.

O atraso, o retrocesso, o autoritarismo, a perseguição contra quem é de esquerda e tem ideias progressistas, enfim, tudo isso são sintomas de uma sociedade doente como está a brasileira.

Esse foi o país que emergiu depois daquelas jornadas de junho de 2013, há mais de quatro anos. O Brasil guinou à direita de uma forma sem precedentes, em curto espaço de tempo, e hoje não vivencia uma democracia. O fascismo está à solta, o autoritarismo, o ódio e a intolerância estão a soltos.

Para se ter uma ideia do cenário autoritário em que atualmente estamos inseridos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), presidido pela conservadora ministra Carmen Lúcia, ontem (24/10/2017), abriu um procedimento administrativo de natureza disciplinar, chamado Reclamação Disciplinar, contra quatro juízes de direito que tão-somente participaram de ato contra o o impeachment de Dilma Rousseff, mais conhecido como golpe de estado.

Link para a estarrecedora notícia: http://agenciabrasil.ebc.com.br/…/cnj-abre-processo-para-ap…

De acordo com informações do conselho, no ano passado, os magistrados André Luiz Nicolitt, Cristiana de Faria Cordeiro, Rubens Roberto Rebello Casara e Simone Dalila Nacif Lopes discursaram em um carro de som durante a realização de um ato público na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. A prova utilizada pelo CNJ para justificar a abertura da investigação foi um vídeo gravado durante a manifestação.

Vídeo divulgado no site do CNJ com cenas da sessão onde a Reclamação Disciplinar contra os quatro juízes de direito foi aberta:

Rubens Roberto Rebello Casara é autor de um livro excelente, chamado “Estado Pós-Democrático – Neo-Obscurantismo E Gestão Dos Indesejáveis”, lançado ano passado pela editora Civilização Brasileira e que foi muito elogiado. Nele, ele descreve o perfil do Poder Judiciário dissociado dos princípios democráticos e a forma persecutória por meio da qual o status quo enaltecedor da hegemonia do mercado capitalista preconizado pelos neoliberais anda tratando as vozes discordantes. Quem não se enquadra no perfil desejado é perseguido.

O processo aberto no CNJ contra a sua pessoa apenas evidencia a perseguição e comprova a tese de seu livro.

 

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Sérgio Moro é o juiz em julgamento

O juiz federal Sérgio Moro é uma criação da grande imprensa, a mesma que ajudou a dar um golpe de estado no Brasil. Ele é o produto, a consequência natural de treze anos de ataques aos governos de Lula e Dilma das forças conservadoras brasileiras, que não sabiam mais o que fazer para fingir que são democratas e que estavam apenas exercendo a liberdade de imprensa depois que perderam quatro eleições presidenciais consecutivas vencidas pelo PT.

Depois que os abusos perpetrados em nome da propalada liberdade de imprensa fracassaram fragorosamente quanto à intenção de eleger quem eles queriam para comandar o país e, assim, colocarem em prática todas as políticas fracassadas e que fizeram do Brasil um dos países de maior desigualdade social do planeta, a grande imprensa teve que se voltar para as suas crias, a exemplo de Sérgio Moro, o juiz que “amadureceu” na magistratura na era dos Governos do PT, ouvindo e concordando, em seu viés conservador, com as críticas da grande imprensa.

Sérgio Moro é filho da campanha de ódio que a grande imprensa brasileira implementou contra as mudanças perpetradas pelos Governos Lula e Dilma. Iguais a ele, existem muitos. No caso dele, algo merece especial atenção. Ele saiu da posição confortável de mero leitor e/ou telespectador da grande imprensa. Ele agora é um ator central no jogo político do poder que irá definir o futuro do país.

Talvez Moro tenha entendido tarde demais que nem tudo o que leu corresponde à verdade dos fatos. Existem pessoas por trás daquelas matérias ignominiosas, muitas delas que estão longe de ser como diziam a ele que eram. Isso faz toda uma diferença. Talvez, eu disse talvez, Sérgio Moro tenha percebido tardiamente que a “verdade” na qual acreditou nunca foi verdade verdadeira. Eram apenas mentiras criadas por interesses escusos, visando alçar o poder. Talvez ele hoje esteja apenas cumprindo um script no qual acreditou boa parte do tempo e não tem mais como voltar atrás.

No entanto, se, de fato, tiver existido, algum dia, algo de idealista em Sérgio Moro, talvez ele pratique um ato de grandeza e perceba que foi manipulado e nada do que ele achava se confirmou. Talvez Moro chegue à conclusão de que foi atraído para um cenário que não lhe compete, nunca lhe competiu. Esse seria o único ato de justiça que ele poderia praticar nessa altura dos fatos. Absolver Lula, antes de significar uma capitulação diante da falta de provas, seria um ato de grandeza e uma espécie de redenção. Talvez Moro seja, de fato, o idealista que muitos acreditam. A decisão que ele irá proferir no processo significará mais um julgamento dele do que de Lula, uma vez que Lula é julgado pelo povo e não por qualquer juiz de direito. Ainda está em tempo de Sérgio Moro perceber isso.

Acredito que Moro esteja atualmente no piloto automático. A pressão pesa sobre seus ombros. É visível. Moro, percebi isso no vídeo que ele gravou para o programa Fantástico, da Rede Globo, não está tão à vontade como antes. Apresenta-se com um semblante cansado, preocupado, tamanho o fardo que colocaram em suas mãos. Visivelmente, não está confortável com a situação. Ele chegou a um ponto que não tem retorno, salvo se ele for um verdadeiro idealista comprometido com o Direito e com a Justiça e reconhecer que esteve todo esse tempo errado, que não há provas e que, portanto, deve absolver Lula.

Caso ele não seja o verdadeiro idealista que muitos pensam que ele é, veremos a mesma coisa de sempre: Moro sucumbirá ao papel que ele aceitou encenar e irá condenar Lula. A questão é que, se ele fizer isso, entrará para a História como o homem que jogou o país na sua pior crise. A História não poupará Sérgio Moro. Nas mãos de Sérgio Moro não está apenas a liberdade de Lula, mas sim o destino da nação e de seu povo nas próximas décadas.

Na minha opinião, quem verdadeiramente está em julgamento é ele, Sérgio Moro, e não Lula. Existem causas em que quem termina se colocando na posição de julgado é o juiz da causa e não o réu. É o caso de Sérgio Moro no processo a que responde Lula no âmbito da Lava Jato. Não se enganem. Não é Lula quem está em julgamento no processo que tramita em Curitiba. É exatamente Sérgio Moro. Ele é quem está em julgamento, o seu senso de Justiça, seu apego à verdade e ao Direito. É o juiz confrontado com a causa e a sua consciência. Decidir causas é algo de suma importância. Vamos ver se realmente Sérgio Moro está à altura dos grandes juízes.

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Sexta Turma do TST confirma violação da Súmula nº 69 do Tribunal num caso de revelia da Caixa Econômica Federal

Foi disponibilizado ontem, 16/03/2017, com data de publicação considerada hoje, 17/03/2017, o acórdão da Sexta Turma do TST que deu provimento aos segundos embargos de declaração para apenas prestar esclarecimentos, sem efeito modificativo, num caso de uma reclamação trabalhista em que a Caixa Econômica Federal (CEF) é revel e confessa quanto à matéria de fato e, dessa forma, o trabalhador fazia jus a receber as verbas rescisórias tornadas incontroversas a partir da ausência de contestação com a multa de 50% do art. 467 da CLT, tudo conforme preceitua a Súmula nº 69 do TST, que trata precisamente da aplicação da referida multa nas hipóteses de revelia a confissão quanto à matéria de fato.

Para a minha desagradável surpresa, a Sexta Turma do TST efetivamente enfrentou o mérito da questão em sede de julgamento do Agravo de Instrumento, quando deveria fazer isso no julgamento do Recurso de Revista que havia sido interposto para impugnar o mérito da decisão do TRT que negou a aplicação da multa em todas as verbas rescisórias que tratavam de diferenças salariais e seus reflexos em décimos terceiros salários integrais, horas extras, depósitos mensais do FGTS etc.

Como o Recurso de Revista foi trancado, sob a inválida alegação de que estaria supostamente “prejudicado” diante do “acolhimento” da pretensão obreira, decisão que flagrantemente viola o direito do trabalhador, previsto no art. 896, alíneas “a” e “c”, da CLT, de recorrer contra a decisão do TRT que restringiu a aplicação da multa de 50% às férias mais 1/3 constitucional, à multa dos 40% do FGTS (deixando de fora os depósitos mensais do FGTS calculados com os reflexos das diferenças salariais de 50 meses) e ao décimo terceiro salário proporcional (devido apenas no último ano do contrato de trabalho, deixando de fora os décimos terceiros salários integrais que sofreriam os reflexos das diferenças salariais devidas no período do desvio de função, que aconteceu durante 50 meses), foi interposto o recurso de Agravo de Instrumento mostrando que era falsa e inválida a alegação de que o Recurso de Revista estaria supostamente “prejudicado”, principalmente quando o trabalhador impugnou a decisão do TRT por violação do art. 467 da CLT e da Súmula nº 69 do TST e pretendia que ela fosse reformada, não havendo que se falar em “acolhimento” da pretensão obreira apto a impedir o regular processamento do Recurso de Revista se o principal interessado mostrou claramente a sua irresignação com a decisão do TRT da 19ª Região quanto ao ponto da multa do art. 467 da CLT, na hipótese da Súmula nº 69 do TST, quando interpôs o referido recurso, com base no art. 896, alíneas “a” e “c”, da CLT, irresignação recursal esta que já tinha sido demonstrada inclusive nos dois recursos de embargos de declaração que foram anteriormente opostos perante o TRT (num total de três que terminaram sendo opostos no Regional), nos quais se requereu esclarecimentos sobre as razões pelas quais a aplicação da multa do art. 467 da CLT, na hipótese de revelia e confissão ficta tratada na Súmula nº 69 do TST, estava sendo restringida às verbas indicadas pelo Regional.

Nos SEGUNDOS Embargos de Declaração que opôs perante o acórdão da Sexta Turma do TST que julgou os primeiros Embargos de Declaração anteriormente opostos, a defesa do trabalhador impugnou a omissão do acórdão em analisar o ponto do Agravo de Instrumento que atacou o motivo usado pelo TRT para trancar o Recurso de Revista quanto ao pedido de reforma da restrição da aplicação da multa de 50% às verbas indicadas.

Em outras palavras, era dever do TST expressamente dizer se o trancamento, com base na alegação de que o Recurso de Revista estava supostamente “prejudicado” no ponto concernente à aplicação da multa de 50%, foi correto ou não.

No entanto, mesmo tendo que se pronunciar expressamente sobre este ponto do Agravo de Instrumento, que é o recurso que se encontra em julgamento, ao proferir a decisão que julgou os segundos Embargos de Declaração, ao invés de enfrentar essa específica questão acerca do trancamento do Recurso de Revista quanto ao ponto da multa, a Sexta Turma do TST, MAIS UMA VEZ, INCORREU EM OMISSÃO, pois passou, para a perplexidade da defesa do trabalhador, a julgar o mérito do pedido veiculado no Recurso de Revista em sede de julgamento do Agravo de Instrumento.

Por outra palavras, vale dizer: A Sexta Turma do TST se pronunciou sobre a questão relativa à extensão da aplicação da multa do art. 467 da CLT, na hipótese de revelia e confissão ficta tratada na Súmula nº 69 do TST, veiculada, no mérito, no Recurso de Revista, se OMITINDO de dar provimento ao Agravo de Instrumento e, consequentemente, sem destrancar o Recurso de Revista, o que flagrantemente ofende o devido processo legal, uma vez que existe o nítido efeito de fechar as portas recursais para o recurso dos Embargos cabíveis para a Seção de Dissídios Individuais, órgão recursal do TST que tem a competência de dirimir as divergências existentes entre as Turmas do TST ou reformar as decisões das Turmas do TST contrárias a súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho ou súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal, haja vista que os Embargos previstos no art. 894, II, da CLT, somente são cabíveis contra as decisões das Turmas do TST que efetivamente julgam o mérito do Recurso de Revista, o qual precisa ser destrancado para que isso aconteça.

Eis o que a Sexta Turma do TST disse no julgamento dos SEGUNDOS Embargos de Declaração que foram opostos pela defesa do trabalhador, conforme a ementa do acórdão, in verbis:

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MULTA DO ART. 467 DA CLT. Decidiu com acerto o Tribunal Regional, pois determinou a incidência da multa de 50% sobre as verbas decorrentes da dispensa sem justa causa deferidas na sentença, portanto, pagas a destempo, e incontroversas, nos exatos termos da Súmula 69 do TST e do art. 467 da CLT, sendo certo que as demais, ou seja, as controversas, como as horas extras e as diferenças salariais deferidas, bem como seus reflexos, não devem receber a incidência da referida multa. Consigna-se que o art. 467 da CLT é claro no sentido de que a única hipótese de pagamento da multa nele prevista é quando há parcelas rescisórias incontroversas e não pagas em audiência. Embargos de declaração providos apenas para prestar esclarecimento, sem efeito modificativo.”

Observa-se claramente que a Sexta Turma do TST, sob a inválida justificativa de prestar meros esclarecimentos, julgou, na verdade, o mérito do pedido do Recurso de Revista de reforma do acórdão do TRT quanto à extensão da aplicação da multa do art. 467, na hipótese de revelia e confissão ficta do empregador tratada da Súmula nº 69 do TST, e disse que ele era improcedente, o que notoriamente fez, inclusive, OMITINDO o fato de que se tratava de hipótese de incidência da Súmula nº 69 do TST, pois OMITIU da decisão o fato do caso tratar de um caso de revelia e confissão ficta da Caixa Econômica Federal, pretendo restringir à hipótese sub examine à mera aplicação do art. 467 da CLT, escondendo da discussão a revelia e a confissão ficta da empresa reclamada, efetivamente ocorrida e decretada nos autos do processo.

Ora, mas isso foi feito sem dar provimento ao Agravo de Instrumento para destrancar o Recurso de Revista, que tem o efeito de manter a decisão do TRT se omitindo de julgar o Agravo de Instrumento no ponto em que especificamente impugnou o motivo pelo qual o TRT negou trânsito à revista, o que claramente prejudica o direito do trabalhador de recorrer da decisão da Sexta Turma do TST para a Seção de Dissídios Individuais do TST pela via do recurso dos Embargos previstos no art. 894, II, da CLT, in verbis:

Art. 894. No Tribunal Superior do Trabalho cabem embargos, no prazo de 8 (oito) dias: (Redação dada pela Lei nº 11.496, de 2007)

(…)

II – das decisões das Turmas que divergirem entre si ou das decisões proferidas pela Seção de Dissídios Individuais, ou contrárias a súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho ou súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pela Lei nº 13.015, de 2014)

(…)

A decisão da Sexta Turma disse que o TRT estava certo quando restringiu a multa do art. 467 da CLT às verbas que indicou, mas nada falou sobre a decisão que trancou o Recurso de Revista, decisão completamente diversa e que trata da questão de saber se o Recurso de Revista estava supostamente “prejudicado” em virtude de um inexistente “acolhimento” da pretensão obreira, como afirmou o TRT quanto ao ponto da multa de 50% do art. 467 da CLT.

Entendo que a decisão da Sexta Turma do TST, além de produzir uma negativa de prestação jurisdicional quando não julgou o Agravo de Instrumento no ponto aqui debatido, efetivamente viola a Súmula nº 69 do TST e o art. 467 da CLT, uma vez que a CEF foi considerada, neste processo, revel e confessa quanto à matéria de fato e, dessa forma, a multa de 50% incide sobre todas as verbas rescisórias cobradas na reclamação trabalhista e deferidas pelo TRT, especialmente as diferenças salariais e seus reflexos, conforme indicado no Recurso de Revista.

Esse procedimento da Sexta Turma do TST é claramente um julgamento per saltum, ou seja, ele “salta” uma etapa, qual seja, a do julgamento do Agravo de Instrumento no ponto em que impugnou a decisão que trancou o Recurso de Revista interposto para impugnar o acórdão do TRT quanto à extensão da referida multa.

Tal procedimento ilegal da Sexta Turma do TST, conseqüência da negativa de prestação jurisdicional consistente em se recusar a apreciar o Agravo de Instrumento no ponto em que impugnou a decisão do TRT que trancou o Recurso de Revista interposto para impugnar o acórdão do TRT que restringiu a multa do art. 467 da CLT às férias mais um terço, à multa de 40% do FGTS e ao décimo terceiro salário proporcional do último ano do contrato de trabalho (2008), tem o efeito de fechar a via recursal dos Embargos para a SDI que ainda era cabível, nos termos do art. 894, inciso II, da CLT, pois é certo que não só a referida decisão violou direta e literalmente a Súmula nº 69 do TST, mas também existem inúmeras decisões de outras Turmas do TST que entendem de forma diferente da que entendeu a Sexta Turma acerca da extensão da aplicação da multa de 50% nos casos de revelia e confissão quanto à matéria de fato por parte do empregador, sendo pertinente citar, a título de exemplo, a seguinte decisão da Terceira Turma do TST, que versa sobre a aplicação da multa do art. 467 nos casos de revelia e confissão ficta, in verbis:

“MULTA DO ART. 467 DA CLT.

O Regional negou provimento ao apelo patronal, pelos seguintes fundamentos (fl. 67-PE):

“Contra a aplicação da multa em epígrafe, alega a empresa Recorrente que ‘a demanda referiu-se a pleitos controversos, onde carecia de constituição do direito pela Reclamante’.

Sem razão.

A multa prevista no art. 467 da CLT deve incidir sobre as verbas trabalhistas incontroversas. Assim, não instaurada qualquer controvérsia acerca do direito às verbas rescisóriashaja vista a revelia e a confissão ficta da ré quanto à matéria fática -, faz jus a autora ao pagamento da multa em questão.

Aplica-se na espécie a Súmula 69 do TST, verbis: ‘A partir da Lei nº 10.272, de 5 de setembro de 2001, havendo rescisão do contrato de trabalho e sendo revel e confesso quanto à matéria de fato, deve ser o empregador condenado ao pagamento das verbas rescisórias, não quitadas na primeira audiência, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento)’.

Nego provimento.”

A ré não se conforma com a condenação, indicando ofensa aos arts. 302, I, do CPC e 467 da CLT. Transcreve arestos.

Tendo o recurso de revista por escopo a uniformização da jurisprudência trabalhista, nenhuma utilidade ver-se-á no processamento de semelhante apelo, quando o tema brandido for objeto de súmula ou de orientação jurisprudencial da Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, situações em que a missão da Corte ter-se-á, previamente, ultimado.

Tal diretriz, antes contida no art. 896, a, parte final, da CLT e na Súmula 333/TST, está, hoje, consagrada pelo mesmo art. 896, § 7º, do Texto Consolidado.

Para o caso dos autos, tem-se que, na dicção da Súmula 69 desta Corte, “a partir da Lei nº 10.272, de 05.09.2001, havendo rescisão do contrato de trabalho e sendo revel e confesso quanto à matéria de fato, deve ser o empregador condenado ao pagamento das verbas rescisórias, não quitadas na primeira audiência, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento)”.

Diante de tal quadro, não visualizo potencial ofensa aos dispositivos evocados, estando superada a jurisprudência colacionada.

Mantenho o r. despacho agravado.

Em síntese e pelo exposto, conheço do agravo de instrumento e, no mérito, nego-lhe provimento.

ISTO POSTO       

ACORDAM os Ministros do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo de instrumento e, no mérito, negar-lhe provimento.

Brasília, 19 de novembro de 2014.

Firmado por Assinatura Eletrônica (Lei nº 11.419/2006)

Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira

Ministro Relator”

Vejam que nessa decisão acima, a Terceira Turma do TST, por entender que a decisão recorrida encontrava amparo na Súmula nº 69 do TST, manteve uma decisão de outro TRT que expressamente disse o que se segue:

“Contra a aplicação da multa em epígrafe, alega a empresa Recorrente que ‘a demanda referiu-se a pleitos controversos, onde carecia de constituição do direito pela Reclamante’.

Sem razão.

A multa prevista no art. 467 da CLT deve incidir sobre as verbas trabalhistas incontroversas. Assim, não instaurada qualquer controvérsia acerca do direito às verbas rescisóriashaja vista a revelia e a confissão ficta da ré quanto à matéria fática -, faz jus a autora ao pagamento da multa em questão.

Aplica-se na espécie a Súmula 69 do TST, verbis: ‘A partir da Lei nº 10.272, de 5 de setembro de 2001, havendo rescisão do contrato de trabalho e sendo revel e confesso quanto à matéria de fato, deve ser o empregador condenado ao pagamento das verbas rescisórias, não quitadas na primeira audiência, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento)’.

Nego provimento.”

Outro exemplo de decisão, dessa vez da Quinta Turma do TST, extraído do PROCESSO Nº TST-RR-3345/2002-016-12-00.5, que expressamente fala que as verbas requeridas na petição inicial, em decorrência da revelia e da confissão ficta do empregador, se tornam incontroversas para fins de aplicação da multa do art. 467 da CLT:
RECURSO DE REVISTA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. MULTA DO ART. 467 DA CLT. REVELIA. As verbas requeridas pelo reclamante na inicial tornaram-se incontroversas, uma vez que as reclamadas principais não apresentaram defesa, ficando constatada a revelia, sendo devida, por conseguinte, a multa prevista no art. 467 da CLT. Dessa forma, segundo o disposto na Súmula nº 69 desta Corte, havendo rescisão do contrato de trabalho e sendo revel e confesso quanto à matéria de fato, deve ser o empregador condenado ao pagamento das verbas rescisórias, não quitadas na primeira audiência, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento). Recurso de revista a que se dá provimento.
 
(…)”

Ou seja, a ausência de contestação por parte do empregador, nos termos da Súmula nº 69 do TST, torna incontroversas, para fins de aplicação da multa do art. 467 da CLT, todas as verbas rescisórias pleiteadas na reclamação trabalhista, sendo absolutamente improcedente a Sexta Turma do TST dizer que as diferenças salariais e seus reflexos, verbas rescisórias que foram pleiteadas na reclamação trabalhista proposta pelo trabalhador e que foram efetivamente deferidas pelo TRT no julgamento dos primeiros Embargos de Declaração opostos perante aquele Regional, eram verbas “controversas” quando se tem em mente que a CEF efetivamente foi considerada, no processo, revel e confessa quanto à matéria de fato.

Como se observa, diante da OMISSÃO da Sexta Turma do TST em efetivamente enfrentar e julgar o mérito do Agravo de Instrumento interposto pelo trabalhador contra a decisão do TRT que trancou o Recurso de Revista no ponto em que se requereu a ampliação da aplicação da multa do art. 467 da CLT, são plenamente cabíveis os TERCEIROS Embargos de Declaração alegando tudo isso, até a título de pré-questionamento da matéria, pois é evidente que se está diante de uma inequívoca negativa de prestação jurisdicional, que viola o inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, que trata da inafastabilidade da jurisdição, e viola o inciso IX do art. 93 da Constituição Federal, pois, ao não enfrentar o ponto do Agravo de Instrumento que deveria enfrentar, a Sexta Turma do TST não profere decisão devidamente fundamentada, vício da decisão caracterizado pelo fato da Sexta Turma do TST não ter se pronunciado e/ou julgado se o trancamento do Recurso de Revista foi correto ou não no ponto em que atacou a aplicação da multa do art. 467 da CLT por parte do TRT.

De outra banda, restam diretamente violadas as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, previstas nos incisos LIV e LV do art. 5º da Constituição Federal, quando, por esta OMISSÃO, se veda o acesso do trabalhador à Seção de Dissídios Individuais pela via do recurso de Embargos previstos no art. 894, inciso II, da CLT, efeito este do acórdão da Sexta Turma do TST que nitidamente prejudica o trabalhador e favorece ilegalmente à Caixa Econômica Federal, que se verá livre de pagar a multa de 50% sobre a maior parte das verbas rescisórias incontroversas que foram deferidas no processo, quais sejam, as diferenças salariais devidas por desvio de função ocorrido no período de 50 (cinquenta) meses e os seus reflexos nas parcelas de 13ºs salários integrais, aviso prévio, depósitos mensais de FGTS e horas extras no período do desvio de função.

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Sexta Turma do TST viola Súmula nº 69 do Tribunal num caso de revelia da Caixa Econômica Federal

Impressionante o quanto a Justiça do Trabalho deste país está instrumentalizada politicamente para prejudicar o trabalhador brasileiro.

Vou discorrer agora, de forma breve tanto quanto possível, sobre o absurdo jurídico que acontece atualmente num processo trabalhista em que a Caixa Econômica Federal (CEF) é a parte reclamada, no qual a Sexta Turma do TST violou a Súmula nº 69 do Tribunal ao se recusar a aplicar a multa de 50% do art. 467 da CLT nas verbas rescisórias incontroversas.

Em junho de 2008, foi proposta uma reclamação trabalhista contra a CEF. O trabalhador venceu a ação, depois de uma árdua batalha judicial em sede de segunda instância, onde se consegui reverter uma situação desfavorável após o julgamento dos dois recursos ordinários interpostos pelo trabalhador e pela CEF.

Para ser sucinto, aconteceu que o trabalhador ganhou cinquenta meses de diferenças salariais por desvio de função no sentido de receber como gerente de relacionamento, verba que geraria reflexos nas demais verbas trabalhistas, principalmente horas extras, aviso prévio, férias mais 1/3 constitucional, 13º salários, depósitos mensais do FGTS e na multa dos 40% do FGTS.

Acontece que, como a CEF foi revel no processo, o trabalhador faria jus, nos termos da Súmula nº 69 do TST, à aplicação da multa de 50% prevista no art. 467 da CLT, que diz o seguinte:

“Art. 467. Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinqüenta por cento”. (Redação dada pela Lei nº 10.272, de 5.9.2001)”

A Súmula nº 69 do TST é muito clara sobre a aplicação da multa de 50% prevista no art. 467 da CLT nos casos de revelia e confissão ficta do empregador:

“SUM-69 RESCISÃO DO CONTRATO (nova redação) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

A partir da Lei nº 10.272, de 05.09.2001, havendo rescisão do contrato de trabalho e sendo revel e confesso quanto à matéria de fato, deve ser o empregador condenado ao pagamento das verbas rescisórias, não quitadas na primeira audiência, com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento).”

No julgamento dos primeiros Embargos de Declaração que foram opostos perante o TRT , a desembargadora relatora reconheceu que havia errado quanto às diferenças salariais por desvio de função e condenou a CEF a este pagamento.

No tocante à multa de 50%, também reconheceu o erro, pois havia anteriormente negado a aplicação porque considerou que o fato da CEF ter pago na data aprazada a rescisão do contrato, isso afastaria a incidência da multa, quando a incidência da multa deriva tão-somente da revelia da CEF, nos termos da Súmula nº 69 do TST, uma vez que, se ela não compareceu à audiência onde deveria apresentar contestação, automaticamente todas as verbas rescisórias cobradas na reclamação trabalhista se tornaram incontroversas para fins de aplicação da multa do art. 467 da CLT.

No entanto, na hora de dizer sobre quais verbas a multa de 50% deveria incidir, a desembargadora relatora restringiu a aplicação apenas à multa do 40% do FGTS (deixando de fora os depósitos mensais do FGTS que sofreriam os efeitos das diferenças salariais deferidas por desvio de função), às férias mais 1/3 constitucional e ao 13º salário PROPORCIONAL de 2008 (deixando de fora os 13ºs salários integrais dos anos em que ocorreram o desvio de função).

Essa decisão até hoje está provocando um prejuízo absurdo nos direitos trabalhistas do trabalhador, verdadeira lesão ao trabalhador, que se encontra atualmente flagrantemente lesado pela Justiça do Trabalho brasileira, pois a multa de 50% deveria incidir sobre as seguintes verbas:

1 – Diferenças salariais dos 50 meses nos quais ocorreu o desvio de função;

2 – Depósitos mensais do FGTS devidos no período do desvio de função, os quais sofreriam os reflexos das diferenças salariais;

3 – Horas extras deferidas e finalmente

4 – 13ºs salários integrais devidos no período do desvio de função.

Todas essas verbas são de natureza salarial e sempre sofreram a incidência da multa prevista no art. 467 da CLT, mesmo antes da alteração deste artigo feita pela Lei nº 10.272/2001, que AMPLIOU O ROL das verbas que sofreriam a incidência da multa quando disse que as verbas rescisórias seriam objeto de aplicação da multa de 50%, quando antes apenas falava em verbas de natureza salarial.

Como se observa, o trabalhador está deixando de receber um valor significativo por conta dessa decisão absolutamente ilegal e danosa ao seu patrimônio, que claramente protege os interesses da CEF em franco prejuízo dos interesses e direitos do trabalhador, o qual, não seria demais dizer, está sendo visivelmente surrupiado pela Justiça do Trabalho, que intencionalmente se recusou a aplicar a multa de 50% prevista no art. 467 da CLT em verbas rescisórias que ela normalmente deveria incidir.

Depois da defesa do trabalhador tentar, em dois Embargos de Declaração sucessivos, opostos posteriormente aos primeiros Embargos de Declaração, obter esclarecimentos sobre as razões pelas quais as demais verbas rescisórias não sofreriam a incidência da multa de 50%, o TRT, após dar provimento parcial aos dois recursos, acabou repetindo na última decisão o que já havia dito antes, o que seja, que a multa somente incidiria sobre a verbas anteriormente indicadas e que o recurso para modificar isso não seria os Embargos de Declaração, o que fez sem prestar os esclarecimentos requeridos, o que foi pedido até para fins de pré-questionamento da matéria, técnica processual que é feita visando preparar a interposição do cabível Recurso de Revista para o TST.

Após o julgamento dos terceiros Embargos de Declaração e diante da recusa em prestar os esclarecimentos requeridos, o trabalhador interpôs Recurso de Revista para o TST, alegando violação do art. 467 da CLT, conforme interpretação da Súmula nº 69 do TST, que também restou violada.

Aqui começa o maior absurdo dessa história toda, que até o presente momento me deixa totalmente perplexo com o fato de termos uma justiça do trabalho tão injusta e desonesta como a que temos neste país.

O TRT trancou o Recurso de Revista quanto ao ponto da multa de 50% alegando que o recurso estaria “prejudicado” neste ponto porque a pretensão do trabalhador havia sido supostamente “acolhida”, mesmo quando o trabalhador vinha se opondo à restrição da aplicação da multa desde pelo menos os segundos Embargos de Declaração que haviam sido opostos.

Contra essa decisão, o trabalhador interpôs o competente recurso de Agravo de Instrumento, visando destrancar o Recurso de Revista quanto ao ponto da multa de 50%, argumentando que, diferentemente do que alegou o TRT, o Recurso de Revista não estaria em nada prejudicado quanto à multa de 50% do art. 467 da CLT, sendo falsa a alegação de que a pretensão do trabalhador havia sido acolhida, tanto que houve a interposição do Recurso de Revista impugnando a decisão por violação do art. 467 da CLT e da Súmula nº 69 do TST, tendo inclusive sido juntadas decisões de outros Tribunais Regionais do Trabalho que demonstravam a existência do dissídio jurisprudencial, pois em outras decisões, as verbas que ficaram de fora na decisão do TRT sofriam normalmente a incidência da multa de 50%.

Depois de passar anos adormecendo no TST, finalmente no ano passado o Agravo de Instrumento foi julgado e, no ponto da multa de 50%, nada foi dito, tendo o TST negado provimento ao Agravo de Instrumento, mantendo a decisão agravada que trancou o Recurso de Revista.

O trabalhador opôs os primeiros Embargos de Declaração, recurso cabível contra as decisões omissas, contraditórias, obscuras ou que contenham erros materiais, indicando precisamente a omissão do acórdão do TST sobre o ponto da multa de 50%, já que nada, absolutamente nada havia sido dito a este respeito no acórdão que negou provimento ao Agravo de Instrumento, isto é, o TST não se pronunciou sobre o fundamento da decisão que havia trancado o Recurso de Revista no ponto da referida multa.

Nos primeiros Embargos de Declaração, o trabalhador requereu que fosse corrigida a omissão no sentido de, enfrentando os argumentos do Agravo de Instrumento que impugnaram a decisão que trancou o Recurso de Revista no ponto da multa de 50%, dar provimento ao recurso quanto a este ponto e finalmente julgar o mérito do Recurso de Revista em relação à multa de 50%, isto é, corrigindo a omissão do acórdão que negou provimento ao Agravo de Instrumento, o TST deveria dizer, primeiro, se a decisão que trancou o Recurso de Revista quanto ao ponto da multa estava correta quando disse que o recurso estaria “prejudicado” e, segundo, se entendesse que estava errada, deveria dar provimento ao Agravo de Instrumento quanto a este ponto e, consequentemente, julgando o mérito do Recurso de Revista quanto à extensão da aplicação da multa prevista no art. 467 da CLT, deveria dizer se a aplicação da multa feita pelo TRT foi correta ou não, se estava certa a restrição, se as demais verbas, de fato, não deviam receber a multa etc.

No julgamento desses primeiros Embargos de Declaração opostos no TST, aos quais foram dado provimento para fins de prestar esclarecimentos, mas sem efeito modificativo da decisão embargada, eis o que surpreendentemente disse o TST, in verbis:

Por fim, com relação ao pedido de aplicação da multa do art. 467 da CLT com incidência em todas as verbas rescisórias, inclusive nas diferenças salariais por desvio de função, nos depósitos de FGTS mensais e nas horas extras e reflexos, verifica-se que não restou omissa a decisão regional, que deferiu o pedido de multa do art. 467 da CLT com incidência na multa de 40% do FGTS, férias com 1/3 e 13º salário proporcional, na forma da Súmula 69 do TST. Logo, a insurgência do embargante demonstra seu inconformismo com o resultado do julgamento do recurso interposto, manifestado mediante a utilização de instrumento processual inadequado para tanto.

Ressalte-se que os embargos declaratórios não podem ser utilizados com a finalidade de sustentar incorreções no acórdão impugnado ou de propiciar um novo exame da própria questão de fundo, de modo a viabilizar, em instância processual absolutamente inadequada, a desconstituição de ato decisório regularmente proferido, conforme pretende o recorrente.”

Vejam que o ministro relator disse que o trabalhador teria demonstrado inconformismo com a decisão proferida pelo TRT mediante a utilização de instrumento processual inadequado para tanto, mesmo quando ele opôs os Embargos de Declaração para pedir esclarecimentos acerca das razões pelas quais as demais verbas não sofreriam a multa, já que o TRT apenas listou as verbas que sofreriam a incidência da multa e nada disse sobre os motivos pelos quais apenas aquelas sofreriam a incidência.

Pior de tudo, esses terceiros Embargos de Declaração foram parcialmente acolhidos, ou seja, nem mesmo o TRT chegou a dizer que a via eleita era inadequada, tanto que conheceu do recurso e deu provimento parcial.

De qualquer forma, ainda que se pretenda dizer que o trecho acima transcrito classificou como inadequados não os Embargos de Declaração opostos perante o TRT, mas sim os Embargos de Declaração opostos perante o TST contra o acórdão que negou provimento ao Agravo de Instrumento, tal alegação é completamente improcedente pelos seguintes motivos:

(i) O acórdão do TST (e não do TRT ou “regional”, que foi o termo usado no trecho acima transcrito) que negou provimento ao Agravo de Instrumento efetivamente foi OMISSO em relação ao ponto da multa de 50% do art. 467 da CLT;

(ii) O trabalhador efetivamente interpôs o Recurso de Revista para impugnar a aplicação da multa da forma restritiva que foi feita pelo TRT e era dever do TST julgar isso, o que deveria fazer somente depois de apreciar o Agravo de Instrumento que atacou a decisão que trancou o Recurso de Revista quanto à questão da extensão da multa, ponto que não foi apreciado pelo TST.

Em outras palavras, descabe qualquer alegação de inadequação da via eleita para veicular as irresignações recursais quando se tem em mente que o Recurso de Revista que foi interposto expressamente impugnou a decisão do TRT quanto ao ponto da multa de 50% e, posteriormente, o referido TRT trancou o Recurso de Revista, alegando que ele estaria “prejudicado” quanto a este ponto em razão de um alegado “acolhimento” da pretensão obreira.

Logo, o trabalhador não se valeu de recurso inadequado para atacar essa decisão quando manejou o Agravo de Instrumento, tendo o TST claramente se omitido de apreciar este ponto específico do recurso no acórdão que lhe negou provimento, omissão que voltou a acontecer no julgamento dos Embargos de Declaração que foram opostos quando, tergiversando ao evitar enfrentar os argumentos do Agravo de instrumento que impugnaram o trancamento do Recurso de Revista, passou a discorrer sobre uma suposta inadequação dos Embargos de Declaração opostos para atacar precisamente a omissão anterior, observada quando do julgamento do Agravo de Instrumento, o que se fez inclusive por meio da intencional confusão entre a (i) omissão do acórdão do TST que negou provimento ao Agravo de Instrumento, que não apreciou o ponto do recurso que impugnou a decisão que trancou o Recurso de Revista quanto à questão da extensão da multa de 50% do art. 467 CLT e a (ii) omissão do acórdão do TRT que restringiu a aplicação da multa.

Como se observa, em qualquer das duas hipóteses, não há que se falar em inadequação da via eleita de que se valeu o trabalhador para veicular suas irresignações recursais. Manejou corretamente o Recurso de Revista e, posteriormente, manejou corretamente o Agravo de Instrumento, tendo ainda manejado corretamente os Embargos de Declaração diante da omissão do TST.

Percebendo a intenção de negar a prestação jurisdicional para evitar, dando uma de “João sem braço”, que o trabalhador recebesse os seus direitos no valor devido (com acréscimo de 50% no montante das verbas rescisórias incontroversas deferidas), já que o que o TST tinha que fazer no julgamento do Agravo de Instrumento era dizer se o trancamento do Recurso de Revista quanto à multa de 50% foi correto ou não, o que exigiria a apreciação da alegação de que o recurso estaria “prejudicado” quanto a este ponto, o trabalhador opôs os segundos Embargos de Declaração e apontou todas essas omissões, expressamente arguindo a negativa de prestação jurisdicional que acarreta nulidade absoluta do julgado, uma vez que o TST, até aquele momento, não havia dito se o trancamento do Recurso de Revista feito pelo TRT foi correto.

O recurso estava pautado para hoje e foi julgado. Para a desagradável surpresa da defesa do trabalhador, houve o provimento dos segundos Embargos de Declaração, mais uma vez, mas sem os efeitos modificativos da decisão embargada.

Ou seja, o TST manteve a decisão anterior e, consequentemente, manteve a decisão do TRT que trancou o Recurso de Revista, mantendo a aplicação restritiva da multa de 50% às verbas por ele indicadas.

Até o momento, a defesa do trabalhador ainda não teve acesso à segunda decisão do TST, que será publicada nos próximos dias. Estou muito curioso sobre o que foi dito nessa segunda decisão para negar o direito do trabalhador, amplamente amparado por decisões de vários Tribunais, inclusive do próprio TST.

Eu imagino que o ministro relator irá dizer que a matéria não se encontra devidamente pré-questionada, o que irá fazer alegando que, como o acórdão que julgou os terceiros Embargos de Declaração opostos perante o TRT se limitou a repetir o que havia dito antes acerca da amplitude da multa, a matéria não estaria pré-questionada como deveria estar, pois os fundamentos do recurso não teriam sido enfrentados.

Esse entendimento é completamente improcedente, uma vez que, efetivamente, o TRT enfrentou a matéria, que se encontra devidamente pré-questionada.

Eis o que o que o TRT julgou, quanto ao ponto da multa de 50%, nos terceiros e últimos Embargos de Declaração que foram opostos pelo trabalhador na segunda instância, in verbis:

“De fato, possui razão o embargante ao alegar que, por força do que já fora decidido anteriormente, não poderia este Juízo simplesmente se negar a apreciar o pleito formulado, alegando que não havia pedido na exordial.

Assim, sanando a omissão apontada, passo a decidir acerca da extensão da decisão sobre a aplicação da multa de 50%, da Súmula nº 69, do TST.

Neste sentido, cumpre observar que este Regional já decidiu acerca da extensão da referida multa, quando assim registrou (fl. 536):

“A incidência do entendimento jurisprudencial invocado pelo autor, tem fundo em norma expressa, Lei nº 10.272/2001. Por tal motivo, e considerando que o v. Acórdão não fez menção às parcelas rescisórias deferidas, passo a sanar o equívoco, ao tempo que determina-se a incidência do acréscimo de 50% sobre tais verbas – multa de 40% do FGTS, férias com 1/3 e 13º salário proporcional.”

Dessa maneira, descabe qualquer tentativa de modificar este entendimento, em sede de embargos de declaração.

Entretanto, a fim de evitar-se novos atos dilatadores, registremos que a extensão da multa da Súmula nº 69, do TST deverá se limitar a incidir sobre os seguintes títulos: multa de 40% do FGTS, férias com 1/3 e 13º salário proporcional, tal qual já decidido à fl. 536.

Ante o exposto, conheço dos terceiros embargos de declaração, para, sanando a omissão apontada, determinar que faça constar no acórdão que julgou os segundos embargos de declaração, como se nele estivesse transcrito, os seguintes termos:

A multa de 50%, prevista na Súmula nº 69, do TST, deverá incidir, apenas, sobre os seguintes títulos: multa de 40% do FGTS, férias com 1/3 e 13º salário proporcional, tal qual já decidido à fl. 536.”

Veja que o desembargador relator do TRT expressamente disse que a aplicação da multa de 50% teria sido feita com base na Súmula nº 69 do TST, o que é suficiente para caracterizar o pré-questionamento da matéria.

Ora, no Recurso de Revista o trabalhador impugnou esse entendimento como violador da Súmula nº 69 do TST e do art. 467 da CLT, requerendo a reforma do acórdão quanto a este ponto no sentido de ampliar a aplicação da multa.

Portanto, a matéria se encontra devidamente pré-questionada, com citação expressa da Súmula nº 69 do TST como fundamento da decisão, súmula que, por sua vez, expressamente cita a lei que alterou o art. 467 da CLT, e cabia um pronunciamento de mérito do TST, o que aconteceria no julgamento do Recurso de Revista.

Como o Recurso de Revista foi trancado neste ponto sob a alegação de que estaria “prejudicado”, cabia antes dar provimento ao Agravo de Instrumento para apreciar o mérito do Recurso de Revista quanto ao ponto da multa, mas o TST se recusou a apreciar os argumentos do Agravo de Instrumento que enfrentavam esse ponto, os quais demonstraram cabalmente a invalidade da decisão que disse que o recurso estaria “prejudicado”.

Não sei como um recurso que impugna a decisão como errada está “prejudicado”.

Estou muito curioso para saber o que raios o TST decidiu para não reconhecer o direito do trabalhador, uma vez que a incidência da multa do art. 467 da CLT nas verbas rescisórias como diferenças salariais, horas extras, décimos terceiros salários, depósitos mensais do FGTS etc é plenamente reconhecida por doutrina e jurisprudência, isso de forma uníssona, como se observa pelas seguintes decisões do TST, in verbis:

Ementa:
RECURSO DE REVISTA. MULTA DO ART. 467 DA CLT. ABRANGÊNCIA.

A Lei nº 10.272/2001 conferiu nova redação ao art. 467, caput, da CLT, não se restringindo à incidência da penalidade sobre os salários incontroversos, alcançando as verbas rescisórias incontroversas, ficando, assim, consideravelmente ampliado seu âmbito de abrangência. Por conseguinte, inserindo-se os depósitos do FGTS não recolhidos e a respectiva multa de 40% no conceito amplo de verbas rescisórias, e não tendo sido pagos no prazo legal, incide a respectiva multa. Precedentes desta Corte. Recurso de revista a que nega provimento.

Processo: RR – 88500-36.2007.5.05.0033 Data de Julgamento: 16/09/2009, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, 5ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 25/09/2009.

Ementa:
RECURSO DE REVISTA. MULTA DO ARTIGO 467 DA CLT – EXTENSÃO DO CONCEITO DE VERBAS RESCISÓRIAS – SALDO DE SALÁRIOS NÃO PAGOS.

O saldo de salários e os salários vencidos são verbas rescisórias para fins de aplicação da multa do artigo 467 da CLT. Recurso de revista conhecido e provido.

Processo: RR – 170600-37.2005.5.01.0063 Data de Julgamento: 17/03/2010, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, 2ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 30/03/2010.

Ementa:
(…) MULTA PREVISTA NO ARTIGO 467 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO.

São isentas de controvérsia, para o fim da multa do artigo 467 da CLT, as verbas de natureza trabalhista que deveriam ter sido adimplidas no curso do contrato de trabalho e que, portanto, independem da discussão acerca da modalidade de rescisão contratual. Não há cogitar em ofensa ao artigo 467 da CLT, porquanto a mera impugnação dos pedidos sem a apresentação do recibo de pagamento das verbas correspondentes não tornam controvertidas as parcelas. Ao contrário, a falta de recibo de pagamento torna incontroverso o direito do empregado às verbas rescisórias. Recurso de revista não conhecido. (…)

Recurso de revista não conhecido.

Processo: RR – 61900-98.2002.5.12.0019 Data de Julgamento: 04/11/2009, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, 1ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 13/11/2009.

Ementa:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA DO ARTIGO 467 DA CLT.

O Tribunal a quo entendeu ser devida a multa, prevista no artigo 467 da CLT, com relação às parcelas do FGTS que não foram recolhidas durante o vínculo empregatício, uma vez que restaram incontroversas e deveriam ter sido pagas na primeira audiência. Dessa forma, não se configura violação ao referido dispositivo legal. Divergência jurisprudencial inespecífica, na forma da Súmula 296 do TST. Agravo de Instrumento não provido.

Processo: AIRR – 40740-35.2004.5.06.0012 Data de Julgamento: 01/04/2009, Relator Ministro: José Simpliciano Fontes de F. Fernandes, 2ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 24/04/2009.

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O dia em que Leandro Karnal “saiu do armário” em termos políticos

Jantar

Leandro Karnal, o filósofo/historiador midiático dotado de voz de padre, finalmente se revelou politicamente para quem nunca tinha percebido seu verdadeiro perfil político ao se encontrar para jantar com o juiz federal Sérgio Moro. Não seria demais afirmar que, até que enfim, Leandro Karnal “saiu do armário” em termos políticos. Eu não me surpreendi nem um pouco com a notícia. Diferentemente da “neutralidade” civilizada que apregoa o fingido Karnal, ele tem lado sim e o lado dele é o do dinheiro que ele ganha bancando o racional que a todos respeita. Posar ao lado do juiz federal Sergio Moro durante um jantar, onde inclusive projetos em comum foram discutidos, segundo o próprio Karnal, diz muito sobre quem ele realmente é.

Neste momento do país, onde Sérgio Moro é corretamente apontado como um juiz federal parcial e um dos maiores protagonistas do golpe de estado perpetrado contra Dilma Rousseff, estando inclusive denunciado na ONU pela defesa do presidente Lula como violador de direitos humanos, é realmente constrangedor ver um sujeito que ganhou notoriedade bancando o pensador racional e ético dar de ombros para todos os atos ilegais e denotativos de desvios de caráter praticados por Sérgio Moro.

Karnal assumiu de vez seu perfil de picareta interessado em ganhar dinheiro sem qualquer compromisso político com a luta contra o golpe de estado fomentado pela Lava Jato. Desconfio inclusive de cooptação, como algo que era o que faltava para ele assumir de vez o que sempre teve vontade de fazer. A imparcialidade de Leandro Karnal é a “imparcialidade” de Sérgio Moro.

Vendo a foto do jantar (acima), postada na página de Leandro Karnal no Facebook, inegável não perceber que ele ostenta na foto o sorriso de quem acabou de conversar sobre “grandes projetos” com o juiz do golpe. É o sorriso de quem está muito satisfeito com a situação no Brasil. Que diferença da postura do escritor Raduan Nassar.

Alguém do alto empresariado brasileiro que financia o golpe provavelmente bancou esse encontro. É uma estratégia de marketing político. Ajuda ambos os lados perante uma parcela da população. Favorece à causa de Moro, o juiz parcial, que tenta a todo custo condenar Lula, mesmo sem provas, e favorece à carreira de Leandro Karnal, que agora ampliará seu rol de admiradores ao atrair a presença ou atenção para a sua carreira dos reacionários que apoiam as ilegalidades da Lava Jato, os quais antes o viam como um filósofo defensor de ideias esquerdistas. Pelo visto,  Leandro Karnal vai agora palestrar para o público da Lava Jato sobre como violar direitos humanos em nome do combate à corrupção. Não pode esquecer, nas palestras, do tópico sobre como um estado de exceção vira algo palatável. Vai ser um “$uce$$o”. Karnal engordou um pouco mais o seu alto faturamento com essa jogada.

Karnal corria atrás de ganhar dinheiro com palestras para um público cada vez maior. Claro que uma pessoa assim não podia ter lado que não o do dinheiro. Um intelectual sério até pode dar palestras. Mas ele não faz disso o objetivo maior de sua vida profissional. Muito menos neutralizando o discurso para parecer “imparcial” politicamente. Essa foi a maior deixa para que Karnal jamais pudesse ser considerado exemplo de defensor de causas políticas que exigem uma tomada de posição. O que puder prejudicar os ganhos dele, ele abdica. É diferente de um palestrante como Lula, que deixa claro sua posição em termos políticos.

No caso do jantar com Sérgio Moro, a explicação pela opção, que normalmente implicaria perder uma parcela do público, a mais progressista e contrária aos arroubos ilegais e antidemocráticos da Lava Jato, é que ele retardou até onde pôde, isto é, até quando a realidade econômica permitiu. Deve ter feito uma análise mercadológica e viu, no atual cenário econômico do país, que era mais positivo para a carreira dele de palestrante, de onde ele certamente extrai a maior parte de sua renda, ficar do lado dos que apoiam Moro. Afinal, a classe trabalhadora viverá tempos de desemprego e de arrocho salarial daqui em diante. Qual o público que sobrará para as palestras dele? Claro que é o público que apoia incondicionalmente a parcial Lava Jato, formado pelos que bateram panela nas varandas dos apartamentos em favor do golpe de estado perpetrado com a Presidenta da República eleita, Dilma Rousseff.

De outra banda, incrivelmente passou despercebido por muita gente o fato do jantar ter acontecido exatos dois dias depois que o TRF da 4ª região, incorretamente, visando blindar o querelado, não recebeu a queixa-crime subsidiária proposta por Lula, Da. Marisa e filhos contra o juiz federal Sérgio Moro, relativa aos atos que ele praticou durante as investigações, como a condução coercitiva feita em franca violação à lei, as interceptações telefônicas ilegais, que culminaram na quebra criminosa do sigilo a partir das divulgações à imprensa, e à busca e apreensão determinada ao arrepio da lei, visando exclusivamente constranger Lula e família, proporcionando um espetáculo midiático com fins manifestamente políticos. Leandro Karnal definitivamente aderiu ao movimento golpista.O jantar entre ele e Moro não foi por acaso. Ele foi pensado estrategicamente. Não pode passar despercebido o relevante fato de que o evento aconteceu exatamente na época em que a queixa-crime subsidiária proposta por Lula e família contra Moro foi invalidamente rejeitada. O jantar, como se observa, tem esse efeito de mostrar solidariedade e apoio a Moro e à Lava Jato.

A atitude do filósofo/historiador careca com voz de padre atrás de rebanho não me surpreendeu em nada. Para mim ele nunca passou de um empresário tentando ficar rico ao difundir suas ideias. Não há qualquer compromisso político com a melhoria da situação do país. Karnal é um elitista que só quer ganhar dinheiro, mesmo que isso implique posar, anunciando amizade e parceria profissional, ao lado de um sujeito que até crime já cometeu no exercício da magistratura quando divulgou conversas gravadas em interceptações telefônicas das mais altas autoridades do país, além de fazer isso com as conversas privadas de Da. Marisa e filhos. Karnal merece ser criticado como um fingido interesseiro atrás de lucro.

Isso se os garotos da Virgínia não chegaram a lustrar a careca do filósofo/historiador com voz de padre para ele dar uma forcinha ao recruta mór na implementação do golpe de estado. Que me desculpem os politicamente corretos, mas é evidente que Leandro Karnal tem o típico perfil do gay enrustido terceiro mundista que sonha em ter o seu lugar ao Sol no Jet Set internacional. Moro tem know how nisso: Até em evento organizado pela revista americana Time já foi homenageado. Leandro Karnal está atrás disso. Em breve estará palestrando na Universidade de Columbia, como fez Sérgio Moro. Nada de novo no front.

São apenas subdesenvolvidos new riches sendo cooptados pelos grupos americanos. Eu sei há muito tempo que gente de origem pobre ou classe média sem consciência política que ascende na vida nunca teve a altivez nacionalista que se deve ter. Isso é coisa geralmente que, no Brasil, só gente de um certo padrão de vida e consciente politicamente tem. A história brasileira é marcada por essa característica. Os maiores nacionalistas brasileiros geralmente vêm da elite brasileira, isso quando adquirem a consciência política necessária. Ascendente social tem uma grande chance de ser colonizado e sem altivez.

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O nefasto proselitismo político feito em cima dos cadáveres da chacina de Campinas

Sinto muito, mas o caso da chacina ocorrida em Campinas na noite do último dia 31/12/2016, em pleno réveillon, em que um homem chamado  Sidnei Ramis de Araujo, de 46 anos, pulou o muro de uma residência num bairro de classe média da cidade e abriu fogo contra todos os presentes no recinto, matando doze pessoas, entre elas a ex-esposa e mãe do seu filho, Isamara Filier, e seu filho de 8 anos de idade, João Victor Filier de Araujo,  e se suicidando em seguida, é muito mais complicado do que dão a entender as rasas e superficiais, nada jornalísticas, opiniões que andam sendo divulgadas pela mídia brasileira, principalmente na blogosfera autodeclarada “progressista”.

O caso, para além da influência da ideologia direitista misógina e/ou machista, trata da alienação parental também, aspecto fundamental do caso que anda sendo desprezado pelas análises “progressistas” feitas em sites da blogosfera brasileira. Seria pertinente fazer uma reportagem séria sobre o assunto e analisar como as coisas estão acontecendo no âmbito da Lei Maria da Penha quando se trata de transferir as medidas protetivas de urgência para os filhos, bem como quais são os critérios que andam sendo aplicados no âmbito do direito de família e do direito da infância e juventude para suspender o convívio entre pais e filhos, direito que goza de amparo constitucional, como deixa claro o caput do art. 227 da Constituição Federal, cuja ideia basilar é repetida em outras leis, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei nº 8.069/1990), como deixa claro o caput do art. 4º da referida lei, que trata do direito à convivência familiar e comunitária, direito melhor detalhado nos arts. 19 usque 24 do ECA .

Pois é, isso vem acontecendo muito. Mulheres se aproveitam da Lei Maria da Penha para impedir que os pais tenham contato com os filhos. Usam a lei de uma forma contrária à sua finalidade social, contando com o despreparo de juízes de direito e de promotores de justiça que terminam concordando com o pedido sem que ele esteja devidamente fundamentado e dentro do que preconiza a referida lei.

O crime bárbaro é injustificado, mas partes da carta escrita pelo autor da chacina, onde ele se refere às motivações do crime, deixam transparecer esse uso, que é real, existe e vem causando inúmeros conflitos familiares que poderiam ser evitados se houvesse uma aplicação mais criteriosa da Lei Maria da Penha.

O Poder Judiciário, caso se confirme que o pai foi alvo de uma medida protetiva de urgência que impedia o contato com o filho, também deve fazer uma autocrítica em relação ao acerto da decisão. Pode ser que o caso concreto não ensejasse essa medida extrema.

A alienação parental é um problema gravíssimo e é verdade sim que muitas mulheres tendem a afastar o pai do convívio com os filhos, o que é inadmissível e não pode ser tolerado.

Eu fico muito tranquilo em falar sobre isso, pois advogo bastante no Direito de Família e tenho conhecimento de causa. Para se ter uma ideia de como anda a insensibilidade e a intolerância de algumas mulheres quando o assunto é o direito de convivência dos pais com os seus filhos, uma vez eu fui procurado por uma mulher que queria simplesmente que o padrasto se tornasse ele próprio titular do poder familiar em relação ao filho que ela teve com outro homem.

Em outras palavras, queria praticamente abolir a paternidade do pai biológico, alegando uma suposta indiferença afetiva dele para com o filho. Quando eu comecei a entrevistar a pretensa cliente e comecei a fazer as perguntas, percebi que ela vivia se mudando de cidade em razão do atual marido dela ser um militar do Exército, que vez ou outra era transferido para outro Estado do país.,

Ou seja, ele vivia se mudando de cidade e queria colocar a culpa da falta de contato no pai biológico, como se ele antes não tivesse dado a atenção devida, chegando ao cúmulo de pretender tornar o padrasto do filho o verdadeiro pai, na realidade concreta dos fatos. Evidentemente que eu declinei o caso e disse que não iria patrocinar a causa. Que ela procurasse outro advogado, registrando que o que ela queria fazer era ilegal.

Iguais a esse caso existem tantos outros. As mulheres que detém a guarda dos filhos constituem nova família e passam a tentar substituir a figura do pai biológico pela do padrasto. Não pode, está errado. O pai biológico tem a primazia no exercício do poder familiar em relação aos filhos, mantendo o direito de convivência, mesmo quando a mãe constituiu nova família. Tudo isso está previsto em lei, é disposição expressa de lei.

O resultado é que um pai que se sente sacaneado pela mãe de seus filhos, que fica boicotando a relação entre pai e filho, fundamental na formação de qualquer pessoa, está sim lidando com uma situação que pode claramente gerar violência.

Então, antes de ficar fazendo politicagem nas redes sociais e na blogosfera, é melhor começar a realmente fazer jornalismo, analisar os fatos, fazer uma reportagem decente, estudar o tema e aí sim tirar as suas conclusões.

Um dos pontos sensíveis da Lei Maria da Penha é o disposto no art. 22, inciso IV, vejam:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I – suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;

II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III – proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2º Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.

§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).

Eu já vi juiz de direito deferir essa medida protetiva de urgência de suspensão de visitas aos dependentes menores SEM ouvir a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar. Pelo que eu li na imprensa, isso também aconteceu no processo em que o autor da chacina de Campinas litigava com a ex-esposa sobre o direito de convivência com o filho, conforme noticiou o site G1, em notícia cuja manchete era “Justiça chegou a proibir atirador de chacina de ver filho, diz advogada”.

Essa decisão, em condições normais, deve estar extremamente fundamentada em fatos relevantes, totalmente comprovados e cujos efeitos sejam demonstrados tecnicamente como prejudicais aos menores.

Foi sobre esse ponto que o homicida de Campinas provavelmente se referiu em sua carta. A Lei Maria da Penha não foi aprovada com a finalidade de criar um quadro de alienação parental. Somente se justifica a adoção dessa medida extrema em casos igualmente extremos. A mera alegação de violência doméstica e familiar contra a mulher, ainda que evidenciada por fortes indícios, NÃO é suficiente para deferi-la. A conduta do agressor tem que se mostrar também prejudicial aos filhos menores e isso depende de uma avaliação multidisciplinar, o que, por si só, já impede a concessão em caráter de tutela de urgência, devendo ser garantido o amplo contraditório.

Segundo eu li na imprensa, especificamente no site do UOL, a mulher acusou o autor da chacina de ter abusado sexualmente do filho. Eu conheço outros casos em que mulheres fizeram isso, apenas para atacar a imagem do pai perante o Poder Judiciário e afastar a convivência dele com o filho, tudo isso feito com a intenção de punir o pai. No caso do autor da chacina, a agressão sexual teria acontecido quando ele tinha 3 anos de idade. A reportagem do UOL relatou que a justiça não comprovou as agressões, mas, sem que a matéria esclarecesse, a justiça entendeu que o garoto deveria ser “protegido” e restringiu as visitas aos dias de domingo, alternados, de forma supervisionada, das 9hs às 12 hs. Ou seja, o pai tinha que ir até a casa da mãe, ficar sob vigilância com o filho por apenas três horas.

Pode ser que tudo isso se justificasse, não sei. Mas pode ser sim que o pai estivesse sendo vítima de uma injustiça, de uma falsa acusação, tudo isso feito por meio de distorção intencional dos fatos.

A chacina foi um caso brutal, horrível e condenável. Acontece que eu considero difícil que um técnico de laboratório, com cursos no exterior (EUA, Holanda, foram países citados) fosse tomar uma medida extrema sem que algo grave, na sua perspectiva, tivesse acontecido. Pode ser sim que ele tivesse sido vítima de uma injustiça e tudo isso cooperou para o que aconteceu. Então, antes de culpar ideologias de direita, é bom antes entender os fatos. Não retira a gravidade do crime, mas pelo menos impede leituras equivocadas do que realmente aconteceu.

Claro que alienação parental se resolve na justiça e não justifica crime nenhum, via de regra, frise-se. Entender a verdadeira causa da chacina ocorrida em Campinas não significa que se esteja “justificando” o crime. Significa apenas falar sobre a verdadeira causa do crime e não distorcer como estão fazendo ao dizer que foi machismo e/ou misoginia. Se o pai convivesse normalmente com o filho ninguém teria morrido.

Ele criou ódio da ex-esposa e dos familiares dela a partir do momento que impediram a convivência dele com o filho baseados numa falsa acusação de abuso sexual ou, no mínimo, numa acusação de abuso sexual que não restou comprovada. Foi isso que causou todo o problema. Nada a ver com misoginia ou machismo. Se é certo que não se pode matar, também é certo que não se pode pretender, inclusive por meio de falsas acusações, separar o pai do filho. Isso é mau caratismo, é canalhice e também é um tipo de violência.

Muitas coisas justificam homicídios. Situações de legitima defesa, de estado de necessidade e de estrito cumprimento do dever legal justificam mortes e retiram o caráter criminoso do homicídio. Não foi o caso da chacina de Campinas, pelo menos com os elementos disponíveis até o momento e que são de conhecimento do público em geral a partir das reportagens sobre o caso.

De qualquer forma, falar nisso perde um pouco o sentido no atual cenário. Ninguém, provavelmente, será punido diretamente pelas mortes. O autor material do crime se matou. Ele mesmo se puniu. A polícia está a procura de quem vendeu a arma usada na chacina. Esse vai ser o bode expiatório, caso seja identificado. Vai assumir a responsabilidade pela chacina na medida da sua participação.

Num pais sério, o(a) juiz(a) de direito e o(a) promotor(a) de justiça que atuaram no processo da regulamentação de visitas no qual litigavam o pai e a mãe da criança que morreram na chacina de Campinas seriam chamados para prestar depoimento. Todo o processo da regulamentação de visitas seria analisado. Se ficasse comprovado que a atuação do(a) juiz(a) de direito e do(a) promotor(a) de justiça ajudaram a produzir a tragédia, eles(as) dois seriam indiciados(as). É o que eu defendo que aconteça, o que seja, que haja uma investigação profunda dos fatos, que todo mundo envolvido seja ouvido e suas condutas sejam investigadas.

É relevante investigar a concessão da liminar que proibiu o convívio entre o pai e o filho desde o início do processo, situação que deve ter perdurado muito tempo, uma vez que a Lei Maria da Penha exige que seja feito antes um estudo multidisciplinar para que o pedido seja analisado. Ainda que outra tenha sido a lei usada como fundamento do pedido, isso não muda nada. As exigências legais se mantém, isto é, eram necessárias mais provas para fundamentar uma decisão tão excepcional como a que afasta o convívio entre pai e filho.

Ou seja, uma liminar sobre isso é praticamente impossível de ser concedida, salvo se os fatos forem robustamente comprovados desde o início. Mas as reportagens falam que houve o deferimento dessa liminar. É preciso sim investigar as circunstâncias processuais que autorizaram essa decisão. E se houve uma decisão incorreta ou até mesmo graciosa, produto de influência e/ou corrupção por parte da família da mãe? Tudo isso deve sim ser analisado, pois eu entendo que foi essa liminar o que desencadeou toda a tragédia.

Para mim, o pai foi apenas um dos atores da tragédia. Mais gente é responsável, inclusive as vítimas. O pai é autor do crime e vítima, ao mesmo tempo. Essa é a leitura que eu faço do caso.

Você não pode analisar o perfil do pai como se ele fosse mais um internauta que se deixa influenciar por ideias de direita, pura e simplesmente. Ele era um pai vivenciando uma situação de alienação parental endossada pela justiça, inclusive em sede de liminar, quando a lei diz que deve existir um estudo multidisciplinar antes de tomar essa medida extrema.

O pai não era um sujeito que fica coçando o saco na Internet o dia todo e que, de uma hora para outra, resolveu enlouquecer e matar todo mundo de quem ele discordava, supostamente influenciado por textos que disseminam ideias de direita. Comparar o pai com qualquer debiloide da Internet é errado. É o que a blogosfera progressista, leviana e irresponsavelmente, anda fazendo com que os outros acreditem. Isso é um absurdo, é mau jornalismo, é sensacionalismo e desvio de conduta por parte de quem anda vendendo essa tese.

Existem outros fatores que incidem na situação. Existia um processo judicial que discutia o direito de convivência entre pai e filho, existia um litígio entre o pai e a mãe. Não se pode analisar a situação extraindo esse dado, que é por demais relevante no entendimento do caso. É isso que muita gente anda fazendo, de forma completamente improcedente. E fazem isso apenas por razões de proselitismo político.

Eu li a carta e os xingamentos de “vadia” que aparecem em alguns trechos são meramente acessórios. Não foi a causa principal. Isso deriva do ódio que ele nutriu depois de ser alienado parentalmente do filho. A causa determinante da chacina foi essa e não qualquer outra.

As matérias a respeito não informam se ele, em algum momento, deteve a guarda do filho. Existe uma confusão sobre isso também. O que eu li e entendi é que o pai se separou da mãe e ambos discutiam o direito de convivência do pai com o filho, o que faz sugerir que a mãe era a guardiã desde o início. Eu não estou supondo que ele era um bom pai exatamente, ainda que eu tenha tomado conhecimento de uma declaração de uma testemunha que atestou isso, que o pai era presente, que sempre era visto jogando bola com o filho, que tinha uma relação aparentemente amorosa etc. Essa declaração apareceu numa reportagem do Fantástico sobre o caso. O que eu digo e reafirmo é que o caso não pode ser tratado como vem sendo tratado por sites como Diário do Centro do Mundo e Socialista Morena, que saltaram na frente e usaram como explicação da chacina coisas como machismo e/ou misoginia, extraindo todo um contexto de litígio judicial que existia entre o pai e a mãe.

Sobre a questão dos indícios, o que se tem de concreto sobre a acusação de abuso sexual é que ela não restou comprovada durante o processo. É preciso que se analise quais foram os fatos e provas que o juiz que concedeu a liminar levou em consideração para proibir a convivência entre o pai e o filho. Isso é importante sim, porque pode ser que a revolta do pai, pelo menos num momento inicial em que isso aconteceu, se justifique. E aí tudo deriva disso, é claro. É errado inverter a ordem dos fatos: para mim está claro que todo o ódio que ele manifesta na carta deriva da situação de ter sido proibido de ver o filho durante muito tempo. E pior, no fim do processo, mesmo com a acusação de abuso sexual não comprovada, a justiça de SP restringiu as visitas ao filho. O pai só teria direito de ver o filho na casa da mãe, na presença dela (chama-se visita assistida), em domingos alternados e por apenas 3 horas. Mas o que realmente amparou essa situação? Por que os blogs não se preocupam em analisar isso e já partem para concluir que foi apenas mais um caso de machismo e misoginia? Esse é o problema.

Se o motivo da proibição da convivência foi a acusação de abuso sexual e ela, ao final, restou não comprovada, o que foi então que respaldou a restrição das visitas? Isso precisa sim ser esclarecido, ora. O pai poderia sim estar sendo vítima de uma injustiça e isso causou todo o problema. Portanto, é errado afirmar misoginia e machismo, pura e simplesmente.

Só espero que a polícia investigue a fundo o caso da chacina ocorrida em Campinas na noite de réveillon. É preciso sim investigar as circunstâncias que resultaram na restrição das visitas ao filho por parte do pai, autor da chacina.

Comentando a coluna assinada pelo articulista do Diário do Centro do Mundo, Kiko Nogueira, onde eu dizia que não era possível restringir o caso a mais um cidadão que endossou o discurso de ódio e intolerância contra as mulheres, um internauta me respondeu dizendo que a defesa da mãe no processo que discutia o direito de visitas do pai ao filho teria uma prova áudio-visual do suposto abuso sexual que o pai teria cometido contra o filho. Segundo o internauta, haveria uma incompatibilidade entre a tecnologia da justiça paulista e o formato por meio do qual a prova teria sido produzida e juntada ao processo (geralmente se faz isso por meio de DVD ou CD ROM ou por softwares adotados pelo Poder Judiciário em cada Tribunal brasileiro). Por essa razão, a justiça paulista não teria conseguido comprovar cabalmente o alegado abuso sexual.

Veja bem a que ponto estão chegando. Alguém, respondendo ao meu comentário que pedia mais investigações sobre o caso, lança uma informação num dos comentários que, para ser colhida, somente tendo acesso aos autos. O fato é que a informação não goza da menor credibilidade, isso por vários motivos.

Primeiro, é muito difícil que advogados que representam uma mãe que acusou um pai de abuso sexual não fossem conseguir fazer a prova no meio adequado à tecnologia de que se vale o Poder Judiciário de SP, ao ponto de inviabilizar completamente a prova.

Segundo, ainda que isso tenha, de fato, acontecido, é inimaginável que não só o Ministério Público mas também o juiz de direito que conduzia a instrução do processo fossem deixar passar em branco a análise de uma prova tão importante num processo em que se discutia o direito de visitas do pai ao filho.

Ora, mesmo que a tecnologia de que se vale o Poder Judiciário de SP não conseguisse, por meio de seus próprios instrumentos e/ou ferramentas, analisar o teor probatório do material de mídia que tivesse sido juntado pela defesa da mãe, outros meios, inclusive externos ao Poder Judiciário, deveriam ser acionados para que se analisasse o material probatório, afinal, as crianças têm prioridade absoluta e uma prova dessa natureza, dada a relevância para o desfecho do processo, jamais poderia passar em branco.

Evidentemente que a alegação não goza de credibilidade e isso provavelmente não aconteceu. O que certamente aconteceu foi que todas as provas juntadas pela mãe para amparar a acusação de abuso sexual supostamente praticado pelo pai contra o filho foram analisadas e não se conseguiu comprovar cabalmente a acusação.Por que exatamente a justiça de SP restringiu as visitas do pai ao filho, isso somente tendo acesso ao teor do processo para saber.

O fato é que está existindo um grande equívoco por parte dos sites e grupos progressistas brasileiros quando interpretam esse caso como mais um de misoginia e/ou machismo direcionado contra as mulheres. Isso é falso. Claramente não foi isso o que aconteceu. O estopim de toda a discórdia reside no litígio que pai e mãe sustentavam no judiciário em relação ao direito de visitas que o pai tem em relação ao filho. Apenas esse dado afasta claramente as conclusões que estão sendo divulgadas em vários sites e pelos mais diversos perfis ligados a movimentos feministas. Se a causa da chacina foi o litígio entre pai e mãe sobre o direito de visitas ao filho, não há que se falar em feminicídio ou qualquer coisa semelhante. Houve um caso isolado onde as coisas saíram do controle gravemente.

Em suma, diante das informações disponíveis, posso resumir o caso da chacina ocorrida em Campinas/SP, na noite do último réveillon, aos seguintes aspectos:

1 – O que causou a chacina de Campinas?

O ódio que o pai sentiu da ex-esposa e de seus familiares por causa da justiça ter restringido o convívio com o filho baseada numa acusação, feita pela mãe da criança contra ele, de abuso sexual supostamente cometido contra o filho, acusação não comprovada no processo onde se discutia o direito de convivência.

2 – Não foi machismo e/ou misoginia, considerando que ele usou a palavra “vadia” em vários trechos da carta onde explicava suas motivações?

O machismo e/ou misoginia que transparecem em trechos da carta não foram determinantes para que ele praticasse a chacina, caso contrário, não precisaria esperar pela perda de convivência com o filho para praticar os homicídios. Sem esse fato, a perda da convivência com o filho, ninguém teria morrido.

3 – Negar a misoginia e/ou machismo como causas determinantes da chacina não é “justificar” o bárbaro crime?

Não, não é justificar o bárbaro crime. É apenas entender a real motivação da chacina, evitando contaminar o caso com ideias políticas enviesadas e irresponsáveis, que não estão nem um pouco interessadas em entender a complexidade do caso e usam a tragédia para fazer proselitismo político, atacando adversários políticos em cima dos cadáveres das vitimas, de forma constrangedora. Em suma, explicar a verdadeira causa da chacina não significa justifica-la.

4 – Se não foi machismo e/ou misoginia, por que então morreram mais mulheres do que homens?

O número de vítimas do sexo feminino tem relações com as pessoas que estavam presentes no recinto, na hora que o assassino entrou e começou a atirar. Se existissem mais homens, o número de vitimas do sexo masculino provavelmente teria sido maior. Portanto, morreram mais mulheres porque as mulheres eram maioria no local e não porque o autor agiu com misoginia e/ou machismo na hora de escolher suas vítimas. Ele provavelmente nem teve tempo de pensar nisso. Saiu atirando em quem encontrou pela frente.

5 -A quem interessa desvirtuar a verdade em relação à verdadeira causa da chacina de Campinas?

Interessa principalmente a quem precisa ter o que dizer e escrever na mídia em relação a bandeiras que defendem em termos políticos, subvertendo causas que são justas e legítimas, a exemplo do combate à misoginia e/ou ao machismo, por meio da distorção de fatos e informações que, na realidade concreta, não guardam propriamente relações com o que se afirma em determinado momento.

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Lula e o PT devem ampliar alianças políticas para enfrentar a Lava Jato

O Brasil só terá alguma esperança no curto, médio prazo, se a disputa política se acirrar. Não adianta o PT de Lula tentar lidar com a situação como se estivesse dentro de uma normalidade democrática, do tipo que ainda acredita que Lula poderá normalmente ser candidato a presidente em 2018 e vencer a eleição. Esse erro não pode ser cometido por Lula. Não mesmo.

Falemos com franqueza, sem medo da verdade: vocês, que acreditam que sofremos um golpe de estado, acham que os golpistas irão deixar Lula se candidatar em 2018 a presidente, com chances reais de vencer? Como é essa lógica? Deram o golpe em Dilma para, dois anos depois, perderem o poder para Lula? É nisso que vocês estão apostando as suas fichas?? Não é sem sentido?

É óbvio, claríssimo, que os golpistas não vão permitir que Lula se candidate na eleição presidencial de 2018 e vença a eleição. Claro que não vão permitir isso.

Então, surge a pergunta: o que fazer diante desse cenário antidemocrático?

O que Lula e o PT devem fazer diante disso, que é totalmente possível de acontecer e certamente irá acontecer se nada for feito para combater essa estratégia golpista?

O PT e Lula precisam pensar nesse cenário, que é o real. E, para começar a agir, devem começar a pensar em construir novas alianças. Essas alianças não podem se restringir ao campo que normalmente apoia Lula e o PT. A aliança deve ser ampla, inclusive com setores que não se sentem à vontade com a grande protagonista do golpe de estado, que é a Lava Jato de Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e cia.

Vejam, o que eu falo aqui é puro pragmatismo político. Eu defendo a ampliação das alianças do campo progressista contra a expressão judicial do Leviatã de que nos falava Thomas Hobbes, que é a Lava Jato. Nessa linha, gente como o senador Renan Calheiros e outros devem ser trazidos para o lado que hoje ainda luta pelo restabelecimento da normalidade democrática. E não se consegue fazer isso atacando pessoas que, como Lula e Dilma, também são alvos da Lava Jato.

Renan Calheiros e outros também sofrem a perseguição da Lava Jato. Evidentemente que existe espaço para negociar uma aliança pragmática contra um mal maior. Renan é liderança. Iguais a ele, existem tantos outros. Se as forças progressistas ficarem com moralismo besta, sabem o que vai acontecer? Ninguém que ainda tem respeito pela democracia ganhará neste país. A Globo e o PSDB ganham, a Lava Jato ganha.

É preciso saber fazer política. Lula sabe e já deu provas disso em várias oportunidades. Não pode, no atual momento, titubear. Política se faz sempre visando ao que de melhor é possível fazer.

Eu pergunto: quem confia na Lava Jato? Eu mesmo não confio. Prefiro mil vezes Lula no poder, ajudando a reconstruir o país, do que Lula preso ou asilado, com a desvantagem absurda de existir no poder uma ditadura midiática-judicial, moralista e corrupta, antipopular, lascando com todo mundo e entregando o país ao capital internacional, que é para isso que aponta a intervenção da Lava Jato na política brasileira. Os fatos são eloquentes e falam por si sós.

Corrupção sempre existiu neste país. De repente, o sujeito vem e quer ser a palmatória do mundo, o que faz passando por cima da Constituição Federal e das leis? Não, isso está errado sim. Não se pode jogar a água suja do banho fora junto com o bebê.

Sejamos objetivos: o que foi que a Lava Jato trouxe de bom para o país? Nada, absolutamente nada. Só crise política e econômica, desemprego em massa, queda vertiginosa do PIB. É contra tudo isso que se deve lutar. O fato é que o atual cenário político, provocado e muito pela atuação ilegítima da Lava Jato, não interessa em nada ao país.

Está na hora de sermos pragmáticos e acabarmos com essa hegemonia de uma operação policial que está detonando com o país. Ou fazemos isso ou estaremos aceitando a hegemonia de Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e cia, “os únicos vestais da nação”, cujo objetivo é acabar com a “velha política” e colocar no poder uma junta burocrática egressa do Judiciário, contando com o apoio da grande imprensa golpista.

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Afastamento de Renan da Presidência do Senado é analogia “in malam partem” e reforça estado de exceção

O afastamento do senador Renan Calheiros da Presidência do Senado Federal, por força de decisão liminar concedida pelo Ministro do STF, Marco Aurélio Mello, é consequência da aplicação da tese originalmente criada pelos juristas Luiz Flavio Gomes e Marlon Reis, em artigo publicado ano passado na Folha de São Paulo, e apenas tem o condão de reforçar o estado de exceção que atualmente vigora no Brasil, onde o Poder Judiciário cada vez mais assume a face de uma espécie de expressão judicial do que o filósofo inglês Thomas Hobbes chamou de Leviatã, o poder incontrolável, sem limites, a subjugar a tudo e a todos, única forma de implantar em definitivo a paz e a ordem, limando a pluralidade política que existe num regime democrático.

Lembro-me que, na época em que a tese dos juristas Luiz Flávio Gomes e Marlon Reis foi divulgada, cheguei a elogiá-la, numa análise perfunctória e sem maior reflexão, mas depois, com cuidado, vi que ela tem furos e eles são graves. A tese, toda ela baseada no § 1º, inciso I, do art. 86 da Constituição Federal, que diz que o Presidente da República ficará suspenso de suas funções nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal, estabelece uma espécie de analogia para os que estejam na ordem sucessória para ocupar a Presidência da República.

Em outras palavras, se o Presidente da República ficará suspenso de suas funções se se tornar Réu, o Presidente do Senado, por exemplo, por ser um dos que estão na linha sucessória do cargo de Presidente da República, também deve ser suspenso de suas funções enquanto Presidente do Senado quando se torna réu, sob pena de se admitir que um réu num processo criminal exerça livremente a Presidência da República, o que é vedado pelo art. 86, § 1º, inciso I, da Constituição Federal.

Em suma, a principal ideia que a tese veicula é a de que quem é réu num processo criminal que tramita perante o STF não pode ser Presidente da República. No entanto, a partir dessa premissa, a tese pretende ir além e termina extrapolando o texto constitucional quando estabelece que os detentores de cargos que estão na ordem sucessória para assumir a Presidência da República também devem ser afastados de seus cargos quando se tornam réus em processos criminais perante o STF.

O problema da tese começa logo quando a Constituição Federal não diz que o Presidente do Senado, quando se torna réu num processo criminal, deve ser suspenso de suas funções. Isso é reservado ao Presidente da República. A analogia mais próxima que se poderia construir, a partir de tais premissas, seria impedir que o Presidente do Senado pudesse, de fato, assumir as funções inerentes ao cargo de Presidente da República quando surgisse a oportunidade, sem que isso implicasse suspensão das funções de Presidente do Senado.

No entanto, a tese construída por Luiz Flávio Gomes e Marlon Reis avança essa etapa e atinge o próprio direito de exercer as funções de Presidente do Senado, quando isso, analisando agora com mais cuidado, me parece uma clara extrapolação do que pretendeu a Constituição Federal.

Existe uma máxima hermenêutica que diz que é vedado ao intérprete dizer o que a lei não disse. Se o silêncio da norma jurídica é eloquente, como é o caso da Constituição Federal quanto à suspensão do Presidente do Senado de suas funções a partir do momento que se torna réu num processo criminal, não cabe ao intérprete preenchê-lo, nem mesmo sob a alegação de que, por ser um dos que estão na ordem sucessória da Presidência da República, não pode se permitir que ele ocupe a Presidência do Senado.

Ora, o impedimento somente surge quando, de fato, ocorre a vacância do cargo de Presidente da República, de modo tal que o Presidente do Senado seja compelido a assumir as funções. Enquanto não surgir a necessidade dele ocupar o cargo de Presidente da República, creio não ser correto suspendê-lo da função de Presidente do Senado. Não poder exercer as funções de Presidente da República nem de longe significa a mesma coisa que não poder exercer as funções de Presidente do Senado.

Penso até mesmo que a analogia criada pelo Supremo Tribunal Federal ofende um dos princípios mais básicos da ciência penal, que é a vedação da analogia in malam partem, que nos informa que é proibido lançar mão de uma analogia em prejuízo do réu.

No caso, apesar da ginástica argumentativa que é feita, o que se tem efetivamente é uma analogia direta entre as situações do Presidente da República e do Presidente do Senado, isto é, da mesma forma que o primeiro é suspenso de suas funções quando se torna réu num processo criminal, o segundo também deve ser suspenso quando a mesma situação for observada. A analogia in malam partem é muito evidente, pois se aplica uma norma especificamente criada para uma situação em outra situação distinta, em franco prejuízo dos direitos do réu que sofre a sanção não prevista para a sua situação. A tese anacrônica, que foi encampada pelo STF não apenas no caso do afastamento do Senador Renan Calheiros da Presidência do Senado, mas também no caso do Deputado Federal Eduardo Cunha, afastado da Presidência da Câmara dos Deputados pelos mesmos argumentos, apenas reforça a sensação geral de que vivemos hoje no Brasil um verdadeiro estado de exceção.

Vivemos tempos obscurantistas no Brasil, onde o Judiciário saiu do protagonismo assentado no que se convencionou chamar de “ativismo judicial”, que teria os seus aspectos positivos, para debandar de vez para a ilegitimidade da intervenção inconstitucional sobre os outros poderes. Vivemos no país uma autêntica rebelião dos juízes e de órgãos como o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, que fizeram um pacto para tomar de assalto o poder, passando por cima da soberania popular, sendo a maior expressão desse movimento ilegítimo a Operação Lava Jato, onde o juiz federal Sérgio Moro se destaca como o principal protagonista, ao lado de procuradores da república como Deltan Dallagnol e outros, além de delegados da Polícia Federal.

A mais grave marcha golpista ocorrida até aqui foi a que aconteceu no último domingo, 04/12/2016. Ela escancara de vez os desígnios autoritários da Lava Jato e de seus apoiadores. Ela é o início da luta final para a implantação da ditadura midiática-judicial no Brasil em seu viés autoritário e opressor. Ela é o acirramento definitivo da luta política pelo poder que acontece em Curitiba entre o Lulismo e o fascismo golpista da Lava Jato e de grupos como o MBL.

Esse é o mais fundamental confronto político em toda essa história, o ápice do golpe que estão tentando passar. O apoio da Rede Globo às marchas não surge por acaso. É o pacto já firmado com a Lava Jato para deter em definitivo Lula e o PT.

A derrubada da presidenta eleita Dilma Rousseff foi apenas uma etapa do plano. A principal etapa começou na prática agora. Ou as forças progressistas reagem de uma vez por todas ou sofreremos um golpe que será sem precedentes, o mais difícil e cruel de todos, o golpe dado pelo Judiciário com o apoio da grande imprensa.

A Lava Jato tem o partido dela. Sim, eles criaram o próprio partido, com ideologia própria. A Globo se aliou. O golpe é a Lava Jato e a Lava Jato é o verdadeiro e grande golpe na democracia, na soberania, na independência e na autonomia brasileiras. Ou paramos a ideologia pseudo-apolítica catastrófica, que na verdade é a sabotagem do regime político tradicional da tri-repartição de funções, e extremamente reacionária da Lava Jato, ou seremos governados por uma junta de burocratas egressos do Judiciário sem respaldo ou legitimação popular, apoiada pela grande imprensa.

Com esse tipo de poder, capaz de neutralizar a tudo e a todos, as coisas ficarão incontroláveis. A posição política assumida pela Lava Jato de ser contra a lei de abuso de autoridade é apenas demonstração inequívoca disso. Eles querem acabar com a “velha política” e colocar no comando das coisas pessoas como Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e que tais.

A Lava Jato é o melhor exemplo encontrado na atuação do Poder Judiciário brasileiro de uma espécie de expressão judicial do que Thomas Hobbes chamava de Leviatã, o poder incontrolável, sem limites, a subjugar a tudo e a todos, única forma de implantar em definitivo a paz e a ordem, limando a pluralidade política que existe num regime democrático. É isso o que a Lava Jato significa ideologicamente com a sua bandeira de criminalização da política. A Lava Jato e tudo o que nela existe de arbitrário, antidemocrático, antipopular, antinacional e inconstitucional são o inimigo a ser combatido por todos os que hoje ainda têm algum apreço pela democracia neste país. A decisão do STF que afastou o senador Renan Calheiros da Presidência do Senado Federal é apenas mais um capítulo do surgimento do Leviatã, em sua expressão judicial, no atual cenário brasileiro.

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A omissão do povo diante do golpe de estado dado contra Dilma Rousseff

A Constituição Federal brasileira de 1988 diz que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. É o chamado princípio da soberania popular, presente no parágrafo único do art. 1º.

Posto isso, a pergunta que deve ser feita, quando analisamos o que acontece no processo de impeachment da Presidenta da República eleita, Dilma Rousseff, é a seguinte: o julgamento pelo Senado Federal concretiza esse princípio, quando se sabe que a condenação de Dilma Rousseff acontecerá sem que ela tenha efetivamente cometido qualquer crime de responsabilidade?

A resposta óbvia é não, não concretiza a soberania popular, uma vez que a condenação proferida pelo Senado Federal implicará, neste caso, cassar a vontade popular veiculada por meio de 54,5 milhões de votos, que foram os votos dados a Dilma Rousseff no segundo turno da eleição presidencial de 2014, na qual derrotou o candidato tucano, Aécio Neves, que é um dos Senadores que julgarão Dilma Rousseff, mesmo pesando contra ele várias acusações de prática de corrupção, como se viu no âmbito da Lava Jato.

Quer dizer, o processo de impeachment, como pensado pela Constituição Federal brasileira de 1988, é um convite ao golpe de estado dado pela via parlamentar. Sempre que a conjuntura política permitir, um golpe de estado será dado no Brasil, gozando inclusive de status constitucional, já que a Constituição Federal expressamente diz que quem julga é o Senado Federal. Em outras palavras, vale o que o Senado Federal disser sobre os atos do Presidente da República serem ou não crime de responsabilidade e ninguém neste país poderá fazer nada, nem mesmo o STF, que não detém competência para mudar a decisão do Senado Federal tomada no processo de impeachment.

Nesse cenário, a vontade popular veiculada na eleição vira um nada, uma coisa marginal, mero detalhe, que pode depois ser superado, sem que o povo que votou seja chamado para participar diretamente do processo de impeachment, o que me parece uma clara contradição com o princípio da soberania popular. Ainda que a Câmara dos Deputados, órgão do parlamento que é constituído pelos chamados “representantes do povo”, detenha papel importante na deflagração do processo de impeachment, pois ela fica responsável pela admissão da acusação, o fato é que o povo termina sendo alijado do processo decisório, que se desenvolve propriamente no Senado Federal, cujos integrantes, como se sabe, representam os Estados da federação.

Trocando em miúdos, isso significa que o povo, na verdade, foi colocado de lado pela Constituição Federal brasileira quando o assunto é impeachment, sendo justamente este dado que imprime ilegitimidade ao processo e permite o que estamos presenciando: o Senado Federal implementará um golpe de estado pela via parlamentar ao condenar a Presidenta da República eleita, Dilma Rousseff, pela prática de crimes de responsabilidade, quando os atos indicados na acusação, em verdade, não são crimes de responsabilidade, como definidos em lei, principalmente quando sabemos que muitos dos atos foram e ainda são praticados por outros chefes do Executivo espalhados nas três esferas de poder, Federal, Estadual e Municipal.

O fato que afasta a ilegitimidade, mesmo neste caso, de impeachment sem crime de responsabilidade, é a omissão popular diante do resultado do julgamento. A aquiescência do povo com a condenação injusta de Dilma Rousseff torna eficaz o resultado e lhe imprime legitimidade. Se o povo que votou em Dilma Rousseff não se manifesta contra o injusto resultado do julgamento, não age efetivamente contra, ele aceita o golpe de estado. E aí não há muito o que fazer. É apenas constatar que vivemos num país onde o povo é desrespeitado em sua soberania e aceita passivamente a injustiça, a violação do princípio da soberania popular. Um povo que aceita isso não está preparado para viver num regime democrático.

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