Decisão do TCU que reprovou contas de 2014 do Governo Dilma deve ser rebatida

A decisão do TCU, proferida na data de ontem (07/10/2015), que rejeitou as contas do Governo Dilma de 2014 é mais política do que técnica. Com isso eu quero dizer que, por mais que existam motivos técnicos para reprovar as contas de 2014, isso somente foi feito porque o TCU age instrumentalizado politicamente contra o Governo Dilma. Basta atentar para o fato de que as tais “pedaladas fiscais” também foram praticadas por outros governos e o TCU, quando não era usado pela oposição da época, nunca reprovou tal prática, o que fez agora com as contas do Governo Dilma de 2014.

A inclinação política ficou clara quando o relator do processo, ministro Augusto Nardes, fez questão de ressaltar e frisar que a responsabilidade direta pelas “pedaladas fiscais” é da presidenta da república, Dilma Rousseff, como se o TCU agora fosse órgão consultivo dos golpistas de plantão, tornando-se, assim, ele mesmo, um órgão golpista que virou palco para cidadãos contra os quais pesam graves acusações, como o próprio ministro relator Augusto Nardes, acusado de ser beneficiado com uma quantia milionária num pagamento feito por empresa investigada no âmbito da Operação Zelotes, operação que a grande mídia abafa, mas que envolve bilhões de reais em corrupção, num esquema onde se pagava propinas para beneficiar empresas com problemas junto à Receita Federal.

Falando especificamente sobre decisão de ontem do TCU, que já era esperada, ela significa, dentre outras coisas, que o órgão foi apropriado pela oposição para ajudar no plano golpista de derrubar Dilma Rousseff do poder. Essa constatação é cristalina. No entanto, é importante saber argumentar não só contra o que eles dizem sobre as “pedaladas fiscais” (especificamente por que elas seriam ilegais), mas principalmente saber argumentar para demonstrar que as tais “pedaladas fiscais”, ainda que se reconheça o caráter ilegal delas, não podem servir de fundamento legal para o impeachment de Dilma Rousseff.

Esse é o aspecto mais importante, qual seja, saber argumentar e demonstrar que as tais “pedaladas fiscais”, ainda que ilegais, não caracterizam a prática de crime de responsabilidade por parte da presidenta da República, Dilma Rousseff, condição necessária para a imposição da pena de impeachment.

São duas coisas completamente diferentes:

1 – Negar o caráter ilegal das “pedaladas fiscais” e

2 – Negar que as “pedaladas fiscais”, ainda que reconhecidas ilegais, caracterizem crimes de responsabilidade praticados diretamente por Dilma Rousseff, de forma tal que os atos ou omissões praticados sejam suficientes para ensejar o impeachment.

Com relação ao item “2”, a discussão sobre quando tais atos ou omissões foram praticados é muito relevante, sendo certo que a decisão do TCU que rejeitou as contas do Governo Dilma de 2014 é imprestável para embasar um pedido de impeachment, porque são atos e omissões observados no ano de 2014, na vigência do mandato presidencial anterior e somente fatos ocorridos no segundo mandato, iniciado em 1º de janeiro de 2015, podem fundamentar validamente um pedido de impeachment de Dilma Rousseff, de acordo com o entendimento da melhor doutrina que se dedica a estudar o assunto, a exemplo do artigo de autoria de Lenio Luiz Streck, publicado no site Conjur na data de 25/08/2015, intitulado “Constituição é contra impeachment de Dilma por fato do mandato anterior“, onde Streck, um dos maiores juristas do país, especializado em hermenêutica jurídica, autor de vários livros sobre o assunto, defende precisamente a impossibilidade constitucional de Dilma sofrer impeachment no atual mandato por fato do mandato anterior de 2011-2014.

Portanto, essa decisão do TCU não tem, analisada a conjuntura, a força política ou jurídica alardeada pela grande imprensa que apoia o golpe contra Dilma Rousseff, necessária para ameaçar mais de perto o mandato da presidenta eleita pela maioria dos que compareceram às urnas e votaram validamente nas eleições de 2014. Além disso, esse parecer do TCU, influenciado pela oposição, pode ser rejeitado pelo Congresso Nacional e virar um nada. No entanto, é preciso reconhecer que ela tem força, tem um certo poder de influência se manipulada pela oposição e pela grande imprensa como se espera que seja, mas não pode ser desprezada. A decisão de ontem do TCU deve sim ser rebatida e refutada na lógica do Estado Democrático Direito, onde o Estado se guia por princípios como o da legalidade, ainda mais quando as “pedaladas fiscais” são um dos principais fundamentos do pedido de impeachment veiculado por Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr.

Para que tudo aconteça de um modo que proteja o mandato de Dilma, se ela não renunciar antes (a essa altura do campeonato, hipótese que ganha força), vai ser preciso ter sustentação política no Congresso Nacional e, principalmente, na sociedade civil organizada e no povo que a elegeu e/ou que não apoia o golpe em plena marcha, além de ser estritamente necessário confrontá-los dentro do ordenamento jurídico que regula a matéria.

Apesar da decisão do TCU que aprovou, à unanimidade de votos, a rejeição das contas do Governo Dilma de 2014 não ter qualquer efeito automático e poder, na conjuntura política, ser impugnada e afastada, não quer dizer que a decisão não signifique nada do ponto de vista legal ou jurídico. Além de falsa, negar essa característica é uma tremenda bobagem. O relatório do TCU que rejeitou as contas tem que ser rebatido ou refutado, inclusive para garantir a legitimidade do Governo Dilma, que não pode se desviar da legalidade, isso por imperativo constitucional. As acusações são graves. Precisam ser repelidas. Os ministros do TCU disseram que o governo Dilma fraudou as contas públicas. Isso não é algo desimportante. Isso é gravíssimo. Por outros termos, é dizer que o governo mente na sua contabilidade, é desonesto nos informes ao mercado de seus balanços, realiza despesas sem controle ou previsão orçamentária, sem autorização legal etc.

Ou seja, para o TCU, o Governo Dilma é um Governo caótico, de gente incompetente e desonesta. Isso nunca será uma “bobagem”. Não se pode desprezar acusações graves como essas sem enfrentar o mérito delas e refutá-las, dentro da lei. Não vejo como justificar para o povo de uma forma diferente dessa. A situação do Governo Dilma é muito difícil. A mídia fez questão de televisionar o julgamento do TCU e isso não foi por acaso. A intenção é influenciar o cidadão comum a achar que o que foi feito é suficiente para derrubar Dilma do poder. E assim o apoio popular para o impeachment é conquistado.

Resultado: Os deputados começam a se sentir intimidados a concordar com o TCU, sob pena de não poderem se justificar para o povo que os elegeu e para a sociedade em geral. Então, ao contrário do que dizem, não vai ser simplesmente o deputado chegar e votar contra a rejeição do TCU. A situação é muito mais complicada do que isso. Democracia não é bater na mesa e impor sua vontade à força. Tem que convencer dentro do debate de ideias. Muitos deputados não deixarão de votar favorável ao que decidiu o TCU sobre as contas de 2014 do Governo Dilma se não existirem meios de negar as ilegalidades apontadas. Não é simplesmente chegar e dizer: “Houve ilegalidades, mas eu vou votar contra o parecer do TCU”. As coisas não funcionam assim, ainda mais com a grande imprensa em cima.

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Arquivado em Direito e Justiça, Política

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